Eu passarinho

 

 

 

            Na terça-feira, por volta das 22h, à toa, à toa, como a andorinha de Bandeira, entrei no site do Millôr e fiquei por longo tempo a passear por suas frases lapidares, seus haicais lampejantes, seus poemas e suas charges inigualáveis.

            Na manhã seguinte, logo que me levanto, sou abatido pela notícia de sua morte e verifico, com um arrepio, que exatamente no horário em que navegava no seu site ele morria em Ipanema.

            Dias antes, como já contei aqui, Bell e eu havíamos antecipado a capa do jornal “O Dia” sobre a morte de Chico Anysio.

            Entre os pensamentos que me assomaram ao saber da morte de Millôr — e interligando-a com a de Chico Anysio —, ocorreu-me que a morte anda de mau humor, à caça de seus desafetos, ou então que o paraíso esteja a precisar de mais alegria. Pensei também, e andei dizendo por aí, que sem Millôr o Brasil emburreceu mais um pouco.

            Eis que acabo de ler no Painel do Leitor da Folha de S. Paulo uma carta do meu querido Gilberto Kujawski dizendo isso, muito melhor do que eu diria: “A morte anda de mau humor. Numa só tacada, roubou-nos os dois maiores humoristas brasileiros vivos. Quem sofre com isso é a inteligência nacional. Millôr Fernandes, ágil e criativo na redação, tradutor de Shakespeare, não se sabe como não entrou para a Academia Brasileiro de Letras. Millôr foi um intelectual brilhante. Chico Anysio não era intelectual, mas era inteligente, alerta, ligado, sobretudo com a maneira de ser do brasileiro”.

            O matreiro Sinhô (que Manuel Bandeira muito admirava), ao se justificar das canções que tomava para si, dizia que “samba é como passarinho, está no ar, é de quem pegar”.

            Há os que não acreditam em coincidências, e os que só creem nelas.

            Eu, fico a ver e ouvir passarinhos.

 

 

 

 

Um comentário

  1. 29/03/12 at 17:10

    Muito bem lembrado, pelo amigo Gilberto, o fato de Millôr não pertencer à ABL. Se bem que ele não aceitaria. Como assim, tomar chá com Sir Ney?

    O gênio defendendo a “paz da descrença”: “Você nunca viu dez mil incrédulos invadirem o país de outros dez mil incrédulos para impor sua descrenças.”

    Passarinhos sempre se aproximam de inspirados, Antonio.

    Beijocas!

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