Já faz algum tempo que não escrevo neste blog. Muitos me agradecerão o silêncio obsequioso. Alguns poucos (e não é que eles existem!) reclamaram. A eles, me explico.
Professor universitário, ao final de cada ano letivo me assoberba uma sucessão de avaliações, provas bimestrais, provas substitutivas (para aqueles alunos que, sem justificativa alguma, simplesmente deixaram de comparecer a uma das provas bimestrais), seguidas dos exames finais, tanto para as turmas regulares, como para as turmas de dependência e adaptação.
Além do trabalho de elaborar e digitar cada uma das provas (tomando o cuidado de não repetir questões, já que há uma cadeia de solidariedade entre os alunos que fornece kit com as provas anteriores das diversas disciplinas, com as respectivas respostas), há ainda o atropelo de corrigir cerca de 500 provas por vez, lançar as notas nos mapas, atender aos reclamos dos injustiçados, tudo isso no lapso de uma semana, entre uma avaliação e outra.
Nada a reclamar, não fosse a crescente e assustadora incapacidade de ler e escrever que os alunos denotam. Com algumas poucas exceções — que nem podem ser consideradas honrosas, pois que é o mínimo a se esperar de quem chega a um curso superior — a grande maioria não consegue apreender o que lê, nem expressar o que pensa. E a trancos e barrancos, arrastando disciplinas em regime de dependência, contando muitas vezes com a complacência de professores que se deleitam em ser agraciados como paraninfo, patrono ou nome de turma, ou ainda com o desânimo e a impotência de outros, acabam obtendo o diploma, para irem engrossar as filas dos bacharéis de fancaria ou dos doutores em coisa nenhuma.
Para meu padecer, leciono algumas disciplinas tidas como teoréticas ou reflexivas, como Filosofia, Teoria Geral do Estado ou Ciência Política, Instituições Judiciárias e Ética, Introdução à Ciência do Direito, que exigem uma capacidade mínima de relacionar idéias e conceitos, fatos e circunstâncias.
O que esperar de um povo ou de uma geração em que 82% dos brasileiros nem sequer ouviram falar do AI-5, como revelado em recente pesquisa? E a cândida justificativa sensibiliza: “Ora professor, eu ainda nem não era nascido…”
Mas o privilégio não é nosso. Percentagem semelhante de corados alemães desconhece quem foi Hitler!
Sem atentar para a sábia advertência de Drummond, perpetrei os dois poeminhas de circunstância que seguem abaixo, rabiscados enquanto aguardava, com paciência franciscana, aqueles dois ou três retardatários, que sempre insistem em permanecer até o último segundo do tempo de prova, olhando para cima ou para os lados, assoviando, à espera de que um passarinho verde, um colega esperto ou até mesmo o professor em desespero lhe assopre uma das respostas enigmáticas.
PÁTRIA
“Minha pátria é a língua portuguesa”
(Fernando Pessoa, Livro do Desassossego)
Se a pátria
é a língua,
brasileiro
não tem pátria,
mas tem lábia.
POEMINHA DO ALUNO DOIDO
Kant?
Não fui avante…
Nietzsche com seu Zaratustra
até me assusta!
Foucault?
Me sufocou.
Racionalismo,
Empirismo,
Jusnaturalismo,
Positivismo.
Tanto antagonismo
me faz sentir
à beira do abismo,
e dessa agonia
não me livra
a vã Filosofia.
Direito e Moral?
É tudo igual…
Só conheço
o que esqueço!