Gabriel é um mensageiro divino, anunciador de novos tempos.
Coube-lhe, segundo os cristãos, anunciar as vindas de João Batista e do Messias, que celebraria a nova aliança com os homens.
Foi ele também o encarregado de revelar o Corão ao Profeta, conforme creem os mulçumanos.
Para os que professam outra fé, um outro Gabriel veio anunciar um mundo novo, uma realidade mágica envolta numa auréola de sonhos e encantos que transfiguraram o universo literário.
Os que habitam nesse universo paralelo podem viver cem anos de solidão, mas não podem viver sem palavras. É com palavras que dão sentido ao que são, ao que acontece, ao que sentem. São viventes tecidos de palavras, o seu modo de viver se dá na palavra e como palavra.
Por isso, conforme registra o discípulo Alberto Manguel em uma de suas epístolas, quando os habitantes da Macondo revelada por Gabriel foram atacados por uma espécie de amnésia progressiva, para não esquecer do que o mundo significava para eles, fizeram rótulos e os penduraram em animais e objetos: “Isto é uma árvore”, “Isto é uma casa”, “Isto é uma vaca, e dela se obtém o leite, que, misturado com café, nos dá café com leite”.
Viver para contá-la. Depois de muito nos contar e alumbrar, Gabriel se foi de mansinho, no seu outono de patriarca, crônica da uma morte anunciada.
Mas não haverá solidão. Por ter estado entre nós e deixado sua palavra, jamais estaremos sós.
“Dança da Solidão” (Paulinho da Viola), com ele e Marisa Monte