“Ausência” (Vinicius de Moraes / Marília Medalha), com Marília
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=iku6IIqIa1Q[/youtube]
Deixa secar no meu rosto
Esse pranto de amor que a presença desatou
Deixa passar o desgosto
Esse gosto da ausência que me restou
Eu tinha feito da saudade
A minha amiga mais constante
E ela a cada instante
Me pedia pra esperar.
E foi tudo o que eu fiz, te esperei tanto
Tão sozinha no meu canto
Tendo apenas o meu canto pra cantar
Por isso deixa que o meu pensamento
Ainda lembre um momento a saudade que eu vivi
A tua imagem fiel
Que hoje volta ao meu lado
E que eu sinto que perdi.
“Modinha” (Tom Jobim / Vinicius de Moraes), com Robertá Sá e Yamandu Costa
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=i0I2jN0pGRY[/youtube]
Annibal Augusto Gama
Regularmente, tarde da noite, vou à janela iluminada da minha casa, e vejo o homem que, ao longe, parece também olhar da janela, igualmente iluminada, do seu sobrado. Ele olha para fora, durante algum tempo, e depois se afasta. Também eu, ao cabo de uns dois minutos, me afasto. Passa-se ainda algum tempo, e o homem que, do sobrado, olha pela janela, fecha-a e apaga a luz. Faço o mesmo.
Isto acontece todas as noites, e quase de madrugada.
Considerei bem todos esses fatos, e cheguei à conclusão, medindo a distância, que precisava conhecer o homem que olhava da janela, todas as noites.
Durante o dia, andei pelas ruas, e acabei descobrindo o sobrado, do qual o homem espia pela janela, recolhe-se e, depois, fecha a janela e apaga a luz.
O sobrado tinha um pequeno jardim à frente, uma cerca alta, de ferro e um portão. E a campainha.
Apertei a campainha e, decorridos alguns minutos, alguém apareceu na porta e perguntou:
─ Que é que o senhor deseja?
Respondi-lhe que precisava falar com ele. E vi que era um homem magro, de baixa estatura, já velho.
─ Pois fale daí mesmo ─ ele acrescentou.
Disse-lhe que dali não, precisava que ele me deixasse entrar e então nos entenderíamos.
Com relutância, ele abriu o portão. Entrei, e segui-o até uma sala.
─ Agora, o senhor diga-me o que tem a me dizer, e acabemos com isso.
Expliquei-lhe que o via, todas as noites, e tarde, ele olhando da janela iluminada do seu sobrado e eu, da minha casa o observava.
─ Ah, então, o senhor é que aparece numa janela iluminada, todas as noites?
De fato era eu. Ele olhava da janela do seu sobrado, e eu olhava da janela da minha casa.
─ O senhor mora sozinho? ─ eu quis saber.
─ Moro. E o senhor?
Também eu morava sozinho.
Assim, tudo entendido entre nós ambos, despedi-me e fui embora.
E continuamos os dois a olhar pela janela iluminada, todas as noites.
O que não sei é se é ele que me olha da janela, ou se sou eu que o olho da janela.
“Janelas Abertas” (Tom Jobim / Vinicius de Moraes), com Tom e Gal Costa
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=ZWbGLHAsqRM[/youtube]
“Canção do Amanhecer” (Edu Lobo / Vinicius de Moraes), com Edu
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=UlRmEIFZh00[/youtube]
amanhecerá
e a manhã será
amanhã seremos
talvez serenos
Força, poeta Adalberto!
Da nossa enviada especial a Paris:
“O que você preparou para Chiquito? Ele está aqui dando mole e a família chega do Rio hoje. Todos vieram comemorar os setentinha.
Selminha”
(Lá no Bloghetto tem mais: clique aqui)
“Chico Buarque é um dos maiores compositores do Brasil. É meu grande e querido amigo, muito bom de ter. Quieto e respeitador. Profissional extraordinário, estudioso, firme. É um homem lindo, maravilhoso, cavalheiro e deslumbrante. Comigo, é uma flor. Não poderia ser mais suave, amoroso e cuidadoso. Das canções que ele fez para eu cantar, não posso escolher uma. Todas são deslumbrantes. Estarão para sempre entre as melhores da minha vida. Isso já é um presente muito grande. Sou grata. Apaixonada por ele. E sua música alcança nobremente a todos. Com o melhor português, a melhor música, a melhor harmonia. Por isso é hora de parar de dizer que brasileiro tem ouvido burro. O brasileiro é sensível e sabe o que é bom. Chico faz aniversário um dia depois de mim. Sou do dia 18 de junho e ele, do dia 19. Quando a gente estava fazendo o show de Chico & Bhetânia, no Canecão (no Rio em 1975), era um sucesso! Ficamos meses em cartaz. Estávamos no palco e resolveram fazer uma homenagem. No final do show, para tudo e entram as ‘canequetes’, de tapa sexo, cada uma com uma TV imensa e oferece para a gente. Chico me olhou e disse: ‘Nunca mais faço aniversário!’ Que vergonha que a gente passou! Mas ele é geminiano, adora fazer aniversário. Este ano ele não está aqui para eu dar um beijo nele. Mando de longe! Chico é tudo. É o máximo” (Maria Bethânia)
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=eCQi7KLxGOI[/youtube]
“Antonio, quando ela abre os braços para o Chico, a emoção é absolutamente visível. E a gratidão por cantar tamanha beleza com ele. ” (Selminha)
“Nossa parceria é fora do comum. Temos apenas duas músicas fora de projetos específicos, ‘Moto-Contínuo” e ‘Nego Maluco’. As outras 40 que fizemos jutos ‘têm patrão’: fizemos músicas para balés e musicais. O balé do Teatro Guaíra, de Curitiba, havia encenado ‘Jogos de Dança’, seis peças instrumentais que fiz. Eles me chamaram para fazer ‘O Grande Circo Místico’ e sugeri o Chico para fazer as letras, pela qualidade dele e porque ele tinha prática de teatro, a carreira dele foi por este caminho. Eu sempre interferi muito nas letras dos meus parceiros, pedindo para trocar uma palavra. Nunca fiz isso com o Chico na vida. Nenhuma letra eu tive que pedir algo, porque ele é completamente obcecado, escreve e reescreve. Crio a expectativa e normalmente vem uma letra melhor do que a que estou esperando. Além de ser um excelente compositor, ele consegue inventar um personagem, caso da ‘Lily Braun’ e da ‘Beatriz’ no ‘Circo Místico’. Nosso encontro foi bom para nós dois. Eu sou um melhor músico por conta do trabalho que fez comigo. Chico consegue adivinhar o que a música quer passar e, muito provavelmente, nem o autor da melodia pensou daquele jeito.” (Edu Lobo)
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=D207r2Te9U8[/youtube]
“Conheci o Chico na década de 1960 em festas na casa de amigos, em São Paulo. Carregávamos a indiferença pelos compromissos e as improvisações da juventude. O Chico ainda não era o Chico, era o ‘Carioca’, que começava a surgir com seu acanhamento e seu violão. Não pude deixar de atender ao chamado dele, em 1969, quando ficou exilado na Itália, me convidando para trabalhar com ele em shows. Chegando a Roma, não tinha show nenhum, e ainda dei dinheiro para o Chico saldar umas dívidas. Permaneci seis meses com ele na Itália, vivendo juntos momentos nem sempre animadores. Dois dias antes de voltar ao Brasil, deixei com ele um tema de despedida para que ele colocasse letra, consolidando o tempo que passamos juntos. Havia ser iniciado, em Fiumicino, pela última estrofe, o que, dois anos depois, seria concretizado como ‘Samba de Orly’, já com a sutil intervenção de Vinicius de Moraes. Porque Orly era o aeroporto no qual desembarcava a maioria dos brasileiros perseguidos pelo regime militar. Já éramos parceiros desde ‘Lua Cheia’, minha primeira composição. Depois fizemos ‘Samba pra Vinicius’. Recentemente, deixei com ele um tema, quem sabe não seja o prenúncio de uma nova canção. Mas nossa mais autêntica parceria é a amizade e a confiança que depositamos um no outro.” (Toquinho)
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=og0ecRWInQw[/youtube]
“O Chico é o mais completo letrista e poeta brasileiro. Se bem que chegando próximo dele vêm mais uns 8 ou 9. O que, no meu entender, prova que fazemos a melhor e mais rica literatura musical do planeta. E, além do letrista, é também um grande melodista. E conseguiu aliar em suas obras, lirismo, política, cultura popular e filosofia, dentro de uma poética surpreendente, rica, belíssima. Serviu de inspiração para tantos letristas novos, mantendo-se assim a tradição de qualidade de letras escritas no Brasil. ‘Renata Maria’, antes de lhe chegar às mãos, tinha o título provisório de ‘Buarquiana 1’. E lhe chegou às mãos através da cantora Leila Pinheiro, que foi a primeira a gravar. Chico me ligou um dia para dizer que iria colocar um nome de mulher, pois, na minha fita, havia um momentos em que ele achou que eu, no meu lararaiá, havia falado algo com sonoridade parecida. Também fizemos ‘Sou eu’, que era ‘Buarquiana 2’, e Diogo Nogueira gravou primeiro, com o Chico. Ele é metódico e meticuloso. E não corre contra o tempo, creio. Já tenho outras duas músicas guardadas para ele colocar letra. Mas não gosto de sair pedindo. Não sou ‘entrão’. Sou tímido com meus ídolos. E Chico é um deles. Nem sei como tive coragem de perguntar se eu podia mandar um samba pra ele.” (Ivan Lins)
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=wyVrBGuBCgI[/youtube]
“A única unanimidade nacional.” (Millôr Fernandes)
“A coisa mais importante em matéria de música popular.”(Rubem Braga)
“Herói nacional, salvação do Brasil, mestre da língua. Tanta coisa que nem cabe aqui.” (Tom Jobim)
“De amor andamos todos precisados, em dose tal que nos alegre, nos reumanize, nos corrija, nos dê paciência e esperança, força, capacidade de entender, perdoar, ir para a frente. Amor que seja navio, casa, coisa cintilante, que nos vacine contra o feio, o errado, o triste, o mau, o absurdo e o mais que estamos vivendo ou presenciando (…) Viva a música, viva o sopro de amor que a música e banda vêm trazendo…” (Carlos Drummond de Andrade, depois de ouvir “A Banda”)
Talvez mestre Millôr tenha exagerado.
Chico não é (ou já não é) uma unanimidade.
Mas continua uma sumidade:
soma idade, mas a idade some dele.
Que assim seja, benfazeja!
Selma Barcellos
Depois de alguma insistência, Rubem Braga resolveu aceitar o título de “Cachoeirense Ausente de 1951”, homenagem criada anos antes pelo irmão Newton para saudar os filhos ilustres da terra.
Rabugento que só, avisou às irmãs que não queria fazer discurso na praça, cumprimentar desconhecidos, nem ir ao Baile da Cidade. Não teve jeito. Fez os três.
A descontração só viria mais tarde, quando pôde enfim bebericar seu uisquinho com os amigos que levara ─ Vinicius, Millôr, Sabino, Otto Lara e Ceschiatti. No dia seguinte, apenas um compromisso oficial: inaugurar o aeroporto da cidade, tantas vezes reinaugurado e abandonado.
Hospedaram-se no melhor hotel de Cachoeiro de Itapemirim, nas proximidades da estação ferroviária, o que deixou os amigos desesperados com as manobras barulhentas das locomotivas madrugada adentro. Até que Millôr ─ ou teria sido Sabino? ou Vinicius?, ninguém sabe ao certo ─ , bateu no quarto de Braga:
─ Rubem, a que horas este hotel chega a Vitória?
Garotos formidáveis.
Mas que mania essa de ligar nossos brilhos literários e artísticos a aeroportos. Será que Millôr, a exemplo de Tom, vai virar um daqueles com forro desabando e urubus fazendo social com os passageiros?
Ele até sugeriu algo como “reconheço que nunca fiz nada para posteridade. Mas a posteridade bem que poderia fazer alguma coisa por mim. Por exemplo – me arranjar algum desses empréstimos a fundo perdido.” Não foi atendido
Braga, um apaixonado por jardins, virou nome de orquídea. Linda, vermelho-púrpura.
E Millorzinho, hein?
Rubem Braga no seu mítico quintal aéreo do apartamento em Ipanema
Manuzinha de uma queda foi ao chão
e o queixo (que tanto beijo) se abriu
num sorriso rubro, sem graça.
Acudiram três cavalheiros,
todos de chapéu (e coração) na mão.
O primeiro foi seu pai,
o segundo, seu Babu,
o terceiro foi o doutor
que lhe costurou com cinco pontos.
Manuela levantou-se brava(mente)
lá da mesa do doutor,
chorou muito, mas depois passou
e o sorriso claro, com graça
para a boca lhe voltou.
A dor do Babu é que não passava
e ao doutor ele indagou
se também podia costurar-lhe
o coração que sangrava.
“Menininha do meu coração
Eu só quero você
A três palmos do chão”
“Valsa para uma menininha” (Vinicius de Moraes / Toquinho), com os dois
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=5f-T3oUtSHI[/youtube]
Selma Barcellos
Que fantásticas as escolhas de mestre Millôr…
“Vinicius que me perdoe plagiá-lo.
Mas beleza é fundamental.”
O seu semblante, redondo Simpáticas feições, cintura breve, Verde carne, tranças verdes. Lábios rubros de encanto A sua língua, pétala de chama. Nos lobos das orelhas |
Mão branca, mão macia, suave e cetinosa
Com unhas cor de aurora e luz do meio dia
Nas hastes cor de rosa.
Luiz Delfino
Os braços frouxos, palpitante o seio.
Casimiro de Abreu
A dorso aveludado, elétrico, felino
Porejando um vapor aromático e fino.
Castro Alves
Seu corpo tenha a embriaguês dos vícios.
Cruz e Souza
Com mil fragrâncias sutis
Fervendo em suas veias
Derramando no ar uma preguiça morna.
Teófilo Dias
Os olhos sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto
A da terra.
Vinicius de Morais
As curvas juvenis
Frescas ondulações da forma florescente
Imprimindo nas roupas um contorno eloquente.
Álvares de Azevedo
Qualquer coisa que venha de ânsias ainda incertas
Como uma ave que acorda e, inda mal acordada,
Move, numa tonteira, as asas entreabertas.
Amadeu Amaral
De longe, como Mondrians
Em reproduções de revistas
Ela só mostre a indiferente
Perfeição da geometria.
João Cabral de Melo Neto
Que no verão seja assaltada
por uma remota vontade de miar.
Rubem Braga
A graça da raça espanhola
A chispa do touro Miúra
Tudo que um homem namora
Tudo que um homem procura.
Paulo Gomide
Nádegas é importantíssimo
Gravíssimo porém é o problema das saboneteiras
Uma mulher sem saboneteiras
É como um rio sem pontes.
Vinicius de Morais
E todo o conjunto deve exprimir a inquietação e espera.
Espera, eu disse?
Então vou indo, que, senão, me atraso!
Millôr Fernandes
(Millôr Fernandes)
“Bonita” (Tom Jobikm / Vinicius de Moraes / Gene Lees/ Ray Gilber ), com Tom e Frank Sinatra
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=tEM-4cxrps0&hd=1[/youtube]