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Soneto épico

 

 

Brenno 4

Este fidalgo engenhoso

(e cavaleiro manhoso)

ostenta ultimamente

uma barbicha que mente

a sua vera idade

(que é a mesma deste confrade):

se a barba parece branca

a vida lhe segue franca.

 

 

                                               SONETO ÉPICO

 

 

Brenno Augusto Spinelli Martins

 

 

                                   Sexagenária sombra que me assombra,

                                   embranquecendo a têmpora e o bigode,

                                   fraquejando a têmpera do cipó de

                                   uma árvore que, frágil, quase tomba.

 

                                   Mas o sonho evanescente me acorda

                                   e o céu me mostra uma estrela brilhante

                                   chamando para a vida e, nesse instante,

                                   meu coração do grande amor recorda.

 

                                   Na fantasia de um engodo pélvico

                                   ressurge o falso herói de glória pouca.

                                   Como convém a um poema épico,

 

                                   desembainho a espada e num só golpe

                                   rompo os grilhões dessa masmorra louca

                                   e fujo para o último galope.

 

 Dom Quixote (Portinari)

 

 

                                               SONETO SOLIDÁRIO DE ANIVERSÁRIO

 

 

 Para o jovem ancião Brenno Augusto,

companheiro de jornada.

 

 

                                   Passem os dias, que é só o que eles fazem,

                                   findem utopias noutras que virão,

                                   prossiga a vida assim sua viagem

                                   que nenhum dia terá sido em vão.

 

                                   Que as esperanças não se esmoreçam

                                   e nem percam a ternura jamais,

                                   que todas as noites nos amanheçam

                                   com desejo de ser um pouco mais.

 

                                   À medida que o cabelo embranquece

                                   os fios de alegrias e desenganos

                                   dessa aventura que a ventura tece,

 

                                   somemos aquilo que foi perdido

                                   para o balanço de ganhos e danos

                                   multiplicar o que foi dividido.

 

 

 

Os dois têm três

 

 

― Manu, quem é que faz aniversário hoje?

― A Manu, Babu!

― Quantos anos a Manu faz?

(Puxa vida, Babu é tão bobinho! Preciso explicar tudo…)

― Três anos, Babu. Tinha dois, agora, três.

(Vamos ver se ele sabe pelo menos isso:) 

― E você, Babu, quantos anos tem?

(Quando vou lhe responder ― errado ―, a verdade me cai na cabeça, como o estalo de Vieira)

― Babu também tem três anos, Manu.

(Ela não questiona a resposta, como sempre faz quando digo algo que lhe parece duvidoso.)

 

 

071

Manu e Babu recém-nascidos

 

 

Manu em dois tempos

Manu aos três

 

 

 

A primeira menina

 

 

PARA CAROLINA,

QUE UM DIA ME FEZ PAI,

E NOUTRO BELO DIA, AVÔ.

 

 photo

 

 

                                    Esta a sina da menina:

                                    dar trabalho à mamãe

                                    até um dia luzidio

                                    em que ela se torna a mãe.

 

                                    Mesmo sendo um sonho lindo

                                    da menina Carolina

                                    só se fala em Manuela

                                    e se esquece da mãe dela!

 

                                    Mas hoje o dia é só dela

                                    da menina Carolina

                                    que nos gerou Manuela

                                    de presente no seu ventre.

 

                                    O Marcel está no céu

                                    e os avós ainda além,

                                    mas não duvide ninguém

                                    que a primeira é Carolina

                                    cuja sina enternece,

                                   e da primeira menina

                                   a gente nunca se esquece.

 

 

Carol, Marcel, Manu

 

 

Sobre motoristas e passageiros

 

 

A homenagem da riberopretana Bell à sua São Paulo

 

                     Bell Gama

bell (bandeira do Brasil) 

 

 

 

 

 

 

 Era janeiro de 2004 e uma só frase rondava a minha cabeça “Non Ducor, Duco”. A inscrição da bandeira de São Paulo servira como mote para as comemorações dos 450 anos de São Paulo e eu era parte da festa. Na época eu trabalhava em uma produtora de eventos que promoveu um dos maiores desfiles que a cidade já viu. 450 carros antigos invadiram as ruas de São Paulo em um domingo de manhã para comemorar o aniversário. 100 carros saíram da zona sul, 100 da oeste, 100 da norte, 100 da leste, e os 50 mais raros estavam na Av. Paulista. A logística de conseguir uma sincronia para que todos andassem simultaneamente na avenida mais famosa da minha cidade (que escolhi para viver) durou meses de preparação. Junto com ela, um programa ao vivo. Foi meu primeiro programa ao vivo em rede nacional ao lado de queridos colegas de profissão. Com direito a entrevistar a Prefeita, ter ponto eletrônico no ouvido e ouvir a adrenalizante (existe essa palavra?)  frase “3, 2, 1… no ar… É com você, Bell!”. Os carros, que despertam a paixão e o ódio da maior cidade do país, foram o destaque da festa.

 

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Os automóveis sempre estiveram na minha vida. Aos 7 anos eu dizia que já sabia dirigir a boa e velha Parati branca do meu pai. Aos 13, peguei escondido seu Opala Diplomata e aprendi a dirigir. Aos 16, roubava o Fiat Palio da irmã e ía sozinha para a escola me sentindo a mais livre das criaturas. No dia 1 de dezembro de manhã, ao completar 18 anos, estava  finalmente tirando a minha Carteira de Habilitação. Aos 20, arrumei o emprego nesta produtora de eventos e televisão que só trabalhava com automóveis. Me descobri jornalista sendo “jornalista automotiva”. Dirigi muitos carros. Daqueles de mais de três dígitos e bem mais do que uma centena de cavalos de potência que sei que nunca mais estarei no volante. Dirigi no Japão, na Alemanha, visitei a fábrica da Maserati e vi carros sendo produzidos manualmente. Escrevi para revistas especializadas, participei de eventos de lançamentos e até hoje sou convidada pela indústria para fazer roteiros para os automóveis. Enfim, sempre fui considerada uma menina que “manja” de carros.
 
Há mais de 2 anos tomei uma decisão radical. Vendi o meu carro. Comprei um apartamento, precisava de grana para a entrada. Na época todo mundo se assustou: Como você vai viver sem carro? Eu também não sabia. Aos poucos, encontrei novos caminhos. Vi que não ter carro em São Paulo me deixa ainda mais livre. Com o tempo, a paixão por dirigir se tornou uma dor de cabeça. Multas, IPVA, Renovação de Carteira, Revisões, Lei Seca, custos, custos, custos… Passei a ser uma má motorista. E não queria sujar minha ficha corrida. Perdi a carta e a paciência. Hoje, não tenho carro nem garagem.
 
As pessoas ainda se assustam com a minha decisão: Como você consegue viver sem carro? Simples: moro perto do metrô. Pego ônibus, táxi, compartilho carro e sou carona preferencial  dos meus amigos. Passei a ver a cidade com os olhos de passageira, dedicando cada momento a uma nova descoberta.  Hoje, ao cruzar a cidade pelo subterrâneo do metrô (sem fone de ouvido ou livro para ler) senti aquele prazer de ser anônima e ter um olhar turista… Reparei na moça chorando, no casal se beijando, na mãe dando bronca no filho, no rapaz compenetrado que lia uma apostila. Passei por várias estações notando suas diferentes personalidades. Eu sou linha vermelha com muito orgulho! Fico na estação Marechal Deodoro, mas o fim da minha linha é no meu time de coração “Corinthians/Itaquera”. Há quem odeie essa linha pois ela leva para a periferia da Zona Leste (Lost). Eu amo. A linha vermelha é a cara São Paulo. E por aqui tem esse bairrismo mesmo… Paulistano que é paulistano sabe a diferença da Linha Verde para a Azul.  Quando lançaram a Linha Amarela fiz questão de ser uma das primeiras a andar como  mesmo espírito que a gente leva uma criança para andar pela primeira vez no metrô. E não há estação tão bonita como a Sumaré.
 
 
metro marechal
 
 
Assim como a cidade, poucos metrôs ainda são conduzidos. Muitos se auto-conduzem. Assim como eu gosto de ser. São Paulo, que completa 459 anos nesta semana, ainda tem uma injustiça: todo mundo deveria ter um metrô para chamar de seu. Para assim poder conduzir o seu olhar para onde bem entender: para as ruas, no papel de motorista ou para a paisagem.
 
metrosp
 
 
 
Bell Gama/janeiro 2013
 
 
 
 

O aprendiz de ternuras

 

 

 

Maestro Soberano 

 

“Todas as vezes que Tom abriu o piano, o mundo melhorou. Mesmo que por minutos, tornou-se um mundo mais harmônico, melódico e poético. Todas as desgraças individuais ou coletivas pareciam menores porque, naquele momento, havia um homem dedicando-se a produzir beleza, O que resultasse de seu gesto de abrir o piano ― uma nota, um acorde, uma canção ― vinha tão carregado de excelência sensibilidade e sabedoria que, expostos à sua criação, todos nós, seus ouvintes, também melhorávamos como seres humanos.”

(Ruy Castro, “O aprendiz de ternuras”, in “A onde que se ergueu no mar ― Novos mergulhos na Bossa Nova”, São Paulo: Companhia das Letras, 2001)

 

 

[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=Ej0fFckXiNs[/youtube]

Vídeo de Fernando Brito

 

 

 

O dia em que Noel nasceu

 

 

 

 

Ontem, Clarice.

Hoje, Noel.

Estava inspirado

Papai do Céu

Naqueles Dezembros!

 

 

 

[youtube]https://www.youtube.com/watch?v=Hzi7nDoGWXc[/youtube]

 

 

 

Solitária

 

 

 Amanhã Bell, nossa estrela, estreia idade nova.

Continua com solitária, apesar da legião de amigos e fãs.

Viva ela!

 

 

 

 

 

 

 

 

Estava com solitária. Mas nunca comi carne de porco. Pelo menos não crua, daquelas que professor de biologia fala que faz ter solitária. Era taenia solium ou taenia saginata? Não sei. Também não comi terra. Tenho pavor das histórias das crianças que comem terra, comem tijolo… já ouvi até de gente que come sabonete. Não sou uma delas. Na minha casa nem tem jardim. Aliás, tem. Mas é um jardim para ser visto, não para se lambuzar de terra. Minha mãe nunca permitiu isso. Aliás, não entendi porque nunca ninguém percebeu que eu tinha solitária. Tenho repulsa dela. Tenho vergonha. Acho que nunca mostrei. Acho que nunca falei.

Interpretação simples, disse minha terapeuta. Era a primeira vez que um sonho tão óbvio como esse se manifestava. Por outro lado, nunca tinha tido um sonho tão figurativo. Sempre senti a solitária dentro de mim, mas nunca quis falar dos meus vermes. Agora eles povoavam meu sonho e faziam lembrar o vazio que se instaurava dentro de mim. Não bastava a revolta adolescente, os amores inventados e as deprês de fim de tarde. Agora, o vazio todo tinha uma forma que habitava dentro de mim e consumia vorazmente tudo que me servia de alimento, diet, light ou não.

Saí do consultório com a cabeça em parafuso. Passei na livraria. Encontrei meu diagnóstico. Na página 12 do Dr. Llosa estava “ Traduzindo em imagem, direi que você acaba de fazer algo que, dizem, algumas senhoras do século XIX, preocupadas com a gordura e resolvidas a recuperar uma silhueta de sílfide, faziam: engolir uma solitária. Já lhe aconteceu alguém que carregasse nas entranhas esse abominável parasita?”

Parabéns, Dr. Llosa! Acaba de encontrar. E agora? Linhas à frente ele concluía: “ A vocação literária não é um passatempo, um esporte, um lazer refinado que se pratica nas horas vagas. É uma dedicação exclusiva e excludente, uma prioridade `a frente da qual nada pode passar, uma servidão livremente escolhida que transforma suas vítimas (suas ditosas vítimas) em escravos”.

Nunca tinha encontrado minha vocação ou fugia dela. Passei inúmeras seções terapêuticas falando de emprego, de trabalho até que ela disse: então porque não abandona este emprego? O pior foi quando disse: mas quais são os seus planos? E eu fiquei por dez minutos dizendo as minhas possibilidades de ascensão na empresa quando ela interveio: Acho que não entendeu a pergunta, não perguntei qual o seu plano de carreira. Perguntei: o que você quer fazer da sua vida?

Pergunta difícil… que há anos procurava responder. Sei lá, faço tudo bem, respondia sempre. E ia levando, alimentando a solitária com tudo o que podia ser alimento: baladas, chocolate, homens, viagens… até igreja evangélica eu tentei. Nada satisfazia a maldita!

Agora eu já sabia. A solitária estava ali. Era minha. Carregaria-a sempre comigo. Tinha que parar de ter repulsa e conviver. Ou melhor, achar a melhor maneira de acalmá-la com alimento.

Devorei Llosa.

Devorei Rubens Paiva.

Devorei Flaubert.

Devorei Clarice.

Devorei Machado.

Devorei Guimarães Rosa.

Devorei Kafka.

Devorei Goethe.

Devorei Camus.

Devorei Garcia Márquez.

Estou devorando Balzac.

E continuo com um apetite desgraçado. Incrédula por nunca ter provado Cervantes, Borges, Cortázar, Dostoiévski, Manuel Bandeira, e tantos outros.

Finalmente, agora as letras alimentam minha revolta solitária. 

 

Isabella Moreira Gama

 04/04/2008

 

 

 

 

 

 

Ex-caras-velhos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                                       Paul McCartney ontem,

                                                                       setentão!

 

                                                                       Chico Burque hoje,

                                                                       sessenta e oitão!

 

                                                                       Ex-caras-velhos

                                                                       mais moços a cada dia

 

                                                                       entornando poesia

                                                                       sopram as velhinhas

 

                                                                       e comem as mocinhas…

 

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[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=21qVqKZxE3Y]

 

 

 

Parabéns, Rio de Janeiro a Janeiro

 

 

Para Selminha e Paulinho, privilegiados amigos queridos.

 

 

“No mar estava escrito uma cidade

no campo ela crescia, na lagoa,

no pátio negro, em tudo onde pisasse

alguém, se desenhava tua imagem,

 

teu brilho, tuas pontas, teu império

e teu sangue e teu bafo e tua pálpebra,

estrela: cada um te possuía.

Era inútil queimar-te, cintilavas.”

 

(Carlos Drummond de Andrade, Mas Viveremos, excerto)

 

 

 

            Hoje é o dia do aniversário do Rio de Janeiro, que completa 447 anos.

            Sou absolutamente fascinado pelo Rio ― sua gente, suas personagens, praias, bibliotecas e livrarias, o Corcovado, o centro velho, a Lapa boêmia, o Jardim Botânico, a Floresta da Tijuca, a inconcebível geografia, o samba que ressoa por todos os cantos ― e é nela que me refugio e refaço sempre que posso, e menos do que gostaria.

            O Rio tem problemas? Claro que sim, como todas as grandes cidades, como todo o Brasil e sua desigualdade afrontosa.

            Mas quando vou me achegando do Rio, encarno o Tom Gama, minha alma canta, sorrio e me acaba num instante com qualquer tristeza…

 

 

 

 

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