Brenno Augusto Spinelli Martins
─ A conta, senhor… ─ anunciou o velho garçom postado ao lado da mesa, bigodes e cabelos grisalhos, magro, ligeiramente corcunda, observando o cliente pelas lentes embaçadas dos óculos. Colete preto, camisa branca, gravata borboleta e um pano úmido pendurado displicentemente no braço esquerdo. Aguardava imóvel, depois de ter depositado a pequena pasta sobre a toalha xadrez.
─ Conta? Mas… eu não pedi ─ respondeu ele, surpreso.
─ Pediu, sim… foi pedida a conta da mesa 29, é essa.
─ Eu, não.
─ Então foi a dama ─ insistiu o garçom.
─ Que dama? de copas? das camélias? Ora, estou só.
─ Ora, aquela moça de cabelo roxo, com brinquinho no nariz, que estava sentada à mesa.
─ Impossível, deve haver algum engano. Não há nenhuma moça ─ argumentou.
─ Então… deve ter sido o outro cavalheiro.
─ Ah, não… que cavalheiro?
─ Aquele cara cabeludo, com tatuagem no braço, que estava sentado bem aqui, nessa cadeira ─ indicou o atendente.
─ Já lhe expliquei… estou sozinho. Só eu ─ disse ele, apontando o próprio peito.
─ Bem, de qualquer forma, a conta foi pedida. Está aqui. O pagamento será em cheque, dinheiro ou cartão? Se for cartão vou buscar a maquininha.
─ Isso… faça isso ─ contemporizou ele, num gesto de cansaço, ─ enquanto isso, vou ao mictório. Onde é?
─ No fundo, segunda à direita _ gesticulou o garçom, enquanto se dirigia ao caixa.
─ Levantou-se com certa dificuldade ─ já tinha cometido algumas doses ─ e cambaleou em direção ao banheiro, não sem antes enfiar no bolso a conta que fora deixada.
Abriu a torneira do lavatório e jogou água no rosto abundantemente. Levantou a cabeça e seu olhar encontrou o espelho e, no espelho, ele… com um fio de pelo branco na sobrancelha, revelado pela luz forte do recinto. Com dificuldade e cuidado para separá-lo dos fios pretos, prendeu com a unha o indesejado e arrancou-o.
Tirou do bolso a famigerada conta, jogou-a no vaso sanitário e deu descarga. Os papeizinhos das comandas ficaram rodopiando no turbilhão e só depois da terceira descarga desapareceram.
Retornou ao salão e sentou-se à mesma mesa, a 29. Curiosamente o velho garçom não estava mais lá. Em seu lugar apareceu um jovem de cabelos encaracolados, bermuda cáqui, camisa coloridamente estampada, com um bloco de pedidos na mão. Devia ter havido uma troca de turno.
─ O que vai ser, senhor? ─ perguntou o jovem, animadamente.
─ Confabularam por alguns instantes, examinou o cardápio, trocaram algumas palavras, algumas risadas se ouviram… e o novo garçom girou nos calcanhares em direção ao balcão, bradando:
─ Olha aí, Tião… mais um pra 29! Bastante gelo!