Assisti ao intrigante documentário A impostora do 11/9, dirigido por James Cruemel, que narra a trajetória da espanhola Alicia Esteves Head, que se fez passar por Tania Head, uma norte-americana que, ferida, teria conseguido sobreviver ao ataque às Torres Gêmeas, fugindo do 78º andar da torre sul, enquanto seu noivo David morria na torre norte.
Sua história de perda e superação, sua luta para reunir as outras vítimas que escaparam com vida da tragédia — às quais sequer era permitido voltar ao local conhecido como abismo no marco zero do atentado — comoveu a todos, e ela logo se tornou líder e presidente da associação de sobreviventes, chegando a ser recebida por políticos de primeira grandeza dos EUA.
Além de ter doado recursos próprios para a causa, graças ao seu empenho conseguiu ajuda financeira do governo, autorização para a primeira visita de sobreviventes ao local em 2003, bem como a inauguração de um memorial em homenagem a eles.
Somente foi desmascarada quando o jornal New York Times publicou uma reportagem em setembro 2006 questionando a veracidade da sua história e revelando que ela não era norte-americana, nem mesmo se encontrava em Nova York no dia do atentado.
Desapareceu logo após, e algum tempo depois os sobreviventes reais receberam um e-mail contando que ela havia cometido suicídio. Como não obteve nenhuma vantagem financeira, sua conduta não é considerada como criminosa os EUA.
Muitos dos sobreviventes, mesmo sabendo da verdade, continuaram agradecidos a ela, pelo muito que lhes fez, ajudando-os a encontrar força para enfrentar o trauma e seguir com suas vidas.
O que me fascina nessa história é a extrema complexidade do ser humano, que nos faz indivíduos absolutamente singulares, quase sempre incompreensíveis uns para os outros (e até mesmo para si próprios), pelo menos no seu universo mais íntimo.
O que terá movido Alicia a se transformar na benemérita Tania?
Especula-se que sofreu um trauma na infância com a prisão escandalosa dos pais, envolvidos em fraudes na Espanha. Que em razão disso e do seu tipo físico, baixinha e gorducha, teria pouco autoestima, e com suas ações estaria buscando ser admirada e acolhida (all we need is love…).
Especula-se. Especula-se.
A vida é uma especulação ou uma hipótese, à mercê de explicações e conclusões.
Mas talvez não haja nenhuma.
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