Há um momento na vida em que o homem não pode fugir do seu destino.
O meu havia chegado.
No turbilhão de pensamentos que me assaltavam, passou-me pela lembrança como num flash o filme Matar ou Morrer, em que o xerife Gary Gooper, sozinho, abandonado pela cidade que defendia, caminhava para o duelo com o pistoleiro e facínora (logo depois, os inesquecíveis Oscarito e Grande Otelo lançavam a chanchada paródica Matar ou Correr).
Assim me sentia, um misto de Gary Cooper e de Oscarito.
Apesar de tudo, continuei a caminhar em direção dele, que me aguardava indiferente, imenso e majestoso.
Como nos filmes de bang-bang, todos se afastaram, abrindo-me o caminho, para assistirem ao confronto final.
Minha mulher e minha filha se abraçavam, choravam e rezavam por mim.
Enfim, estávamos frente a frente, só eu e ele.
Tudo o que tinha pensado e preparado antes sumiu por completo da minha mente.
Com uma coragem e calma que não sabia ter, avancei mais um pouco, resoluto, e quando ele também avançou em minha direção enfiei-lhe o punho esquerdo que ele havia me destroçado um ano antes, naquele mesmíssimo local, à mesma hora e num dia igual.
Mas ele apenas me lambeu o braço, como a se desculpar, e então me lancei de corpo inteiro, mergulhando nas suas entranhas.
Como velhos amigos que se reencontram, nos divertimos e trocamos afagos durante um largo tempo.
Quando o deixei e caminhei de volta à areia, até o biscoiteiro (aquele mesmo do ano passado) me aplaudia.
Rio de Janeiro, 11 de janeiro de 2010