Matar ou Correr

 

 

 

                    Há um momento na vida em que o homem não pode fugir do seu destino.

                    O meu havia chegado.

                    No turbilhão de pensamentos que me assaltavam, passou-me pela lembrança como num flash o filme Matar ou Morrer, em que o xerife Gary Gooper, sozinho, abandonado pela cidade que defendia, caminhava para o duelo com o pistoleiro e facínora (logo depois, os inesquecíveis Oscarito e Grande Otelo lançavam a chanchada paródica Matar ou Correr).

                     Assim me sentia, um misto de Gary Cooper e de Oscarito.

                    Apesar de tudo, continuei a caminhar em direção dele, que me aguardava indiferente, imenso e majestoso. 

                    Como nos filmes de bang-bang, todos se afastaram, abrindo-me o caminho, para assistirem ao confronto final.

                    Minha mulher e minha filha se abraçavam, choravam e rezavam por mim.

                    Enfim, estávamos frente a frente,  só eu e ele.

                    Tudo o que tinha pensado e preparado antes sumiu por completo da minha mente.

                    Com uma coragem e calma que não sabia ter, avancei mais um pouco, resoluto, e quando ele também avançou em minha direção enfiei-lhe o punho esquerdo que ele havia me destroçado um ano antes, naquele mesmíssimo local, à mesma hora e num dia igual.

                    Mas ele apenas me lambeu o braço, como a se desculpar, e então me lancei de corpo inteiro, mergulhando nas suas entranhas.

                    Como velhos amigos que se reencontram, nos divertimos e trocamos afagos durante um largo tempo.

                     Quando o deixei e caminhei de volta à areia, até o biscoiteiro (aquele mesmo do ano passado) me aplaudia.

 

Rio de Janeiro, 11 de janeiro de 2010

 

 

 

 

5 comentários

  1. bellgama
    12/01/10 at 16:39

    Lindo, lindo! O biscoiteiro disse que ficou emocionado com o seu reencontro com o mar!
    Aproveite! Ti doro!
    beijo

  2. Lilian
    13/01/10 at 15:04

    Prezado amigo: As coisas por aqui estão bem. Mas estariam infinitamente melhores com o senhor. Mas… o senhor merece um descanso longe de quem lhe da(mos) tanto trabalho. Aproveite bem!
    Parabéns pela coragem, pela bravura de enfrentar logo de cara tão poderoso inimigo! Mas tem que ser assim mesmo: ou corre ou enfrenta. Não somos o tipo de gente que “corre”; consequentemente, só nos resta enfrentar…
    Mas o senhor me confundiu com os astros de cinema: o mais lindo, o mais perfeito de todos sempre foi Cary Grant (se fosse pra fazer homem “em série” o melhor modelo, sem dúvida, seria ele; esta seria a minha recomendação, o meu pedido, a Deus… rsrs)
    Tive que acessar o Google Imagens para me lembrar do Gary Cooper. Se não me engano ele antecedeu o deslumbrante CARY GRANT. Ave, Cary!

  3. sonia kahawach
    14/01/10 at 10:42

    Matar ou Morrer… Matar ou Correr… Nada disso, querido. Enfrentar e cair de cabeça nas ondas que só revigoram e renovam as energias. Boas férias!

  4. Rosângela
    15/01/10 at 0:42

    Você escreve cada vez melhor. Aguardo ansiosa o livro.
    Não esperava menos de você, querido primo. Quem há de
    desafiar um Gama? O flash do bang-bang foi cult e voltei
    à infância. Bons tempos de Cine São Luiz e Odeon em Franca,
    onde os cowboys eram sucesso absoluto da garotada . Também
    recordei das boas gargalhadas do papai e das suas imitações
    de mocinho e bandido. Viu quanta coisa boa você faz por mim mesmo sem saber? É sempre uma alegria acompanhar o seu blog. Boas férias e
    uma reconciliação plena com ele – o mar.

  5. Marcel
    22/01/10 at 14:18

    Leitor atrasado que sou, passei por aqui e não poderia deixar de cumprimentá-lo por esse texto maravilhoso. Daqui de Ribeirão, vi a cena como num filme. Abraço

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