Mas que início de ano! Quantas perdas seguidas!
Agora se foi o querido Pena Branca (José Ramiro Sobrinho), aos 70 anos, quieta e mansamente, como era o seu jeito.
Em dupla com o irmão Xavantinho (Ranulfo Ramiro da Silva, que morreu em 1999), e depois em carreira solo, Pena Branca representava a verdadeira e mais pura tradição da música e da viola caipiras, mas sem se congelar no tempo, dialogando com as novas gerações da MPB.
As interpretações da dupla dos já clássicos Cuitelinho (folclore recolhido por Paulo Vanzolini e Antônio Xandó), Luar do Sertão (de João Pernambuco e Catulo da Paixão Cearense), Tristeza do Jeca (de Angelino de Olivera), Cálix Bento (folclore adaptado por Tavinho Moura) e a Cio da Terra (de Milton Nascimento e Chico Buarque), entre outros, são insuperáveis e se incluem entre as mais belas páginas do cancioneiro popular.
Assisti a um breve depoimento de Renato Teixeira (autor de Romaria e de outras maravilhas) que bem retrata a pureza e autenticidade de Pena Branca. Quando recebeu a notícia de que o seu álbum Semente Caipira, lançado em 2000, havia ganhado o Grammy de melhor disco “sertanejo”, telefonou para amigos perguntando:
— Me avisaram que fui premiado com um tal de Grame, o que que é isso?
O paradoxo ou ironia está no fato de que ele e o irmão sempre marcaram o contraste em relação ao boom mercadológico da falsa música sertaneja ou country, com a insuportável proliferação de duplas esgoelantes que cantam (?) qualquer coisa, menos música caipira ou de raiz, como têm o desplante de dizer. Como bem definiu Rolando Boldrin,“Ele e Xavantinho foram heróis da resistência caipira. Dois dos poucos que não se renderam ao sertanejo de mau gosto e de alto consumo”.
A sua figura sempre sorridente, serena, acolhedora, inspirava paz e bondade ao seu redor. E quando começava a cantar com sua voz macia e dedilhar sua viola tudo isso se materializava e a gente até podia crer que a vida valia a pena.
Assista aqui a um trecho do programa Ensaio, com Pena Branca e Xavantinho, apresentado pela TV Cultura, em 1991.