A comemoração de datas cívicas com paradas militares é algo que me causa espécie, como diriam os eminentes ministros da nossa Excelsa Corte.
Se as datas são cívicas (do latim civicus, aquilo que é relativo ao cidadão, à cidade ou civitas), por que os militares delas se apoderam e se exibem, enquanto os demais cidadãos ficam parados, apenas assistindo? Daí talvez a denominação de parada.
Nem venham me dizer que representantes da sociedade civil também participam dessas paradas. Quando tal ocorre, a parcela é mínima em comparação com o enorme contingente militar, e para tomar parte os civis (sempre os primeiros chamados a morrer pela pátria quando esta se envolve em alguma guerra) são obrigados a se enquadrar aos padrões militares, marchando em formação.
Num mundo tão carente de paz e entendimento, com tantas fronteiras físicas, sociais e ideológicas, qual o sentido dessa exibição do poderio militar e bélico nacional, com seus tanques, canhões, mísseis, caças e o que valha?
A quem se busca intimidar ou ameaçar? Os outros países? O próprio povo?
Haja vista o enorme fervor por esse tipo de ostentação sempre demonstrado por tiranos de todos os matizes — de Hitler a Mussolini, passando por Stálin, Mao Tsé-Tung, Generalíssimos e ditadores latino-americanos.
Durante a última ditadura militar no Brasil (esperemos que tenha sido realmente a última), por pouco não acabei preso com um grupo de colegas do Diretório Acadêmico quando vazou o nosso plano de fazer uma manifestação num 7 de Setembro.
Na Grécia antiga o termo idiota (do grego idiotés) referia-se àquele que só se interessava pela vida privada, que recusava a política (do grego polis) e não atendia ao chamamento básico da sua humanidade como zoon politikon.
Retomando esse sentido originário, os civis somos tratados como idiotas, postos à margem das paradas comemorativas, como se o patriotismo fosse apanágio dos militares.
Já dizia o pensador inglês Samuel Johnson que “o patriotismo é o último refúgio do canalha”, aforismo esse que o nosso não menos extraordinário pensador Millôr Fernandes subverteu ― e melhorou ― para “a pátria é o primeiro refúgio do canalha”.
Reencarnando Pessoa, Caetano Veloso canta que “a língua é minha pátria / e eu não tenho pátria, tenho mátria / e quero frátria.”
E por falar em mátria e paradas militares, o exemplo maior de amor e devoção é o daquela mãe que vendo o filho soldado a marchar em meio ao batalhão, comenta orgulhosa com o marido:
— Olha só que gracinha. Nosso filho é o único marchando no passo certo!
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Não existe evento mais constrangedor, sobretudo quando se manda separar os que não “gostam” com um tapume de 2m.
O que é a letra de “Língua”, meu Deus… Caetano no auge da inspiração.
Beijocas!
Nossa língua portuguesa veio do latim… “Última flor do Lácio, inculta e bela” como dizia Olavo Bilac, sempre procuro manter um rigor estilístico com ela, pena que tem gente que a deturpa, escrevendo e falando errado…
Abraços,
André
Mas você percebeu, André, que, desejando enfatizar algo, recorremos à repetição das letras? E parece que isto veio pra ficar… Só espero que o pessoal saiba que isto é apenas mais um recurso da nossa rede mundial e que a grafia continua valendo perfeita, como sempre foi…
Vejo nas ditas paradas cívicas uma convocação implícita para as guerras, como se os cidadãos devessem estar sempre dispostos para alguma eventualidade. Querem passar (e conseguem) o conceito de que patriotismo é sinônimo de serviço militar para a Nação, essa mãe tãoooo distraída!… (E somos mesmo filhos da Mãe, tão distraídos quanto ela!)