Quando papai não está (o que ocorre pelo menos dois dias por semana), Babu vai buscar Manu na escola.
No final do dia, ela é sempre a mais desgrenhada da turminha. Tintas variadas colorem seus dedos, respingam nas bochechas e no pescoço. Restos de massinha grudados na roupa e nos sapatos, o cabelo sem os laços e as fitas com que chega impecável no início da aula. Outro dia o cabelo, que ela diz ser “amarelo”, estava com uma mecha verde. Uma das professoras, sorridente, logo me tranquilizou
— É guache, só lavar que sai.
No trajeto até sua casa, que se alonga em razão da hora do rush, sentada na cadeirinha ela matraqueia sem parar, conta-me o que fez e o que vai fazer, cantarola musiquinhas diversas.
— Canta comigo, Babu!
Depois de uma breve pausa, comunica radiante:
— Babu, Manu tem “perereca”, mamãe tem “perereca”; papai tem “pipi”.
Opa, não é cedo demais para isso? Ela só tem dois anos e meio!
Mas se ela mexe no iPad muito melhor do que eu, não deveria me surpreender.
Mantenho a naturalidade:
— Isso mesmo! E o Babu, o que ele tem?
Meditativa, murmura:
— O Babu… O Babu… O Babu…
E fulmina:
— Que que você tem, Babu?
Contenho o riso, e tento explicar:
— O Babu não é igual o papai? Então…
— A Maria Clara tem “perereca”; o Antônio tem “pipi”, replica.
— Pois é. O Babu também se chama Antônio, contorno.
— Não, Babu! O Antônio é meu amigo da escolinha…
E logo muda de assunto, com a mesma sem-cerimônia que havia começado.
Tomando nosso uísque da sexta-feira no “Bar do Chorinho”, relato o diálogo ao meu amigo Brenno.
Ele se engasga com a bebida e quase cai da cadeira de tanto rir.
Quando se recompõe, me sai com esta:
— Para ela Babu não tem sexo, idade, nome… “Babu” é uma entidade!
Quem haverá de me aguentar esta “entidade” doravante?