Posts from setembro, 2012

O sexo dos anjos

 

 

 

 

 

 

          Quando papai não está (o que ocorre pelo menos dois dias por semana), Babu vai buscar Manu na escola.

          No final do dia, ela é sempre a mais desgrenhada da turminha. Tintas variadas colorem seus dedos, respingam nas bochechas e no pescoço. Restos de massinha grudados na roupa e nos sapatos, o cabelo sem os laços e as fitas com que chega impecável no início da aula. Outro dia o cabelo, que ela diz ser “amarelo”, estava com uma mecha verde. Uma das professoras, sorridente, logo me tranquilizou 

          — É guache, só lavar que sai.

          No trajeto até sua casa, que se alonga em razão da hora do rush, sentada na cadeirinha ela matraqueia sem parar, conta-me o que fez e o que vai fazer, cantarola musiquinhas diversas.

          — Canta comigo, Babu!

          Depois de uma breve pausa, comunica radiante:

          — Babu, Manu tem “perereca”, mamãe tem “perereca”; papai tem “pipi”.

          Opa, não é cedo demais para isso? Ela só tem dois anos e meio!

          Mas se ela mexe no iPad muito melhor do que eu, não deveria me surpreender.

          Mantenho a naturalidade:

          — Isso mesmo! E o Babu, o que ele tem?

          Meditativa, murmura:

          — O Babu… O Babu… O Babu…

          E fulmina:

          — Que que você tem, Babu?

          Contenho o riso, e tento explicar:

          — O Babu não é igual o papai? Então…

          — A Maria Clara tem “perereca”; o Antônio tem “pipi”, replica.

          — Pois é. O Babu também se chama Antônio, contorno.

          — Não, Babu! O Antônio é meu amigo da escolinha…

          E logo muda de assunto, com a mesma sem-cerimônia que havia começado.

          Tomando nosso uísque da sexta-feira no “Bar do Chorinho”, relato o diálogo ao meu amigo Brenno.

          Ele se engasga com a bebida e quase cai da cadeira de tanto rir. 

          Quando se recompõe, me sai com esta:

          — Para ela Babu não tem sexo, idade, nome… “Babu” é uma entidade!

          Quem haverá de me aguentar esta “entidade” doravante?