Annibal Augusto Gama
Hesitei em ir-lhe dizer que tudo estava acabado entre nós, mas afinal fui. E ela me respondeu:
— Nada acaba, tudo continua e se transforma.
Ignoro se ela sabia disso através de Lavoisier.
— Se tudo continua e se transforma, eu me transformei e, por isso…
Ela me interrompeu:
— Eu vou continuar, ainda que transformada, em você.
Era justamente isso que me aborrecia, ou perturbava, nela: essa competição filosófica que nos acompanhava até na cama.
— Margarida, por que você não é simplesmente Margarida? — perguntei-lhe.
— Eu sou Margarida e todas as mulheres — ela rebateu.
E tinha razão. Cinquenta anos depois, ela permanece, transformada ou não, em mim.
Que raio de mulher persistente, que é a mesma e todas as outras!
Gama, gostaria que soubesse que essa declaração de amor que seu pai escreveu é absolutamente encantadora. Ele consegue ser irreverente e bem humorado e absurdamente terno. Combinação rara!
Margarida múltipla, espaçosa, insistente, atravessada na retina, na garganta, no coração…
Gama, que declaração lindíssima de amor essa que seu pai fez.
Abraçaço.