Selma Barcellos
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“Sempre digo que a praia seria um lugar ótimo se não fossem a areia, o sol e a água fria. É só uma frase. Gosto do mar. O diabo é que a gente sempre tem na cabeça um banho de mar perfeito que nunca se repete. O meu aconteceu em Torres, Rio Grande do Sul, em algum ano da década de 50. Sim, crianças, em 50 já existiam Torres, o oceano Atlântico e este cronista, todos mais jovens. O mar de Torres estava verde como nunca mais esteve. Via-se o fundo?
Via-se o fundo.
Víamos os nossos pés, embora a água estivesse pelo nosso pescoço, e como eram jovens os nossos pés. Havia algas no mar? Iodo, mães-d’água, siris, dejetos, náufragos, sereias? Não, a água estava límpida como nunca mais esteve. Os únicos objetos estranhos eram os nossos pés, e como isso faz tempo. Até que horas ficamos na água? Alguns anoiteceram dentro d’água e estariam lá até agora se não tivessem que voltar para a cidade, se formar, fazer carreira, casar, envelhecer, essas coisas.
Como o cronista explica sua aversão ao verão depois de tais lembranças? É que eu não gostava do verão. Gostava de ser mais moço.”
Claro que a maré de saudade do Verissimo me trouxe os deliciosos banhos da infância em Icaraí, os tatuís na areia, a bola de gomos coloridos, o Já-Já de coco … Mas, querem saber? Meu banho de mar perfeito aconteceu há pouco tempo, aqui em Itacoatiara.
Entre um compromisso e outro, resolvi dar um mergulhinho rápido na praia vazia das segundas-feiras. Cenário? Sol e azul em deslimite, mar dormindo, brisa leve, água transparente…
Amigos, foi mergulhar e emergir sorrindo. Simplesmente não conseguia desfazer a expressão. Quem me visse, diria que eu estava lembrando de algo engraçado. Que nada. Nem pensamento eu tinha. Apenas… sorria.
Agenda cancelada, saí caminhando pela orla, vagarosamente, de volta pra casa.
Dizem que é endorfina. Eu chamo de felicidade mesmo.
Itacoatiara (foto de Julie Buckley)