“Não, solidão, hoje não quero me retocar
Nesse salão de tristeza onde as outras penteiam mágoas”
“A mais bonita” (Chico Buarque), com Bebel Gilberto e Chico
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=57_2f6nuP2Y&hd=1[/youtube]
“Não, solidão, hoje não quero me retocar
Nesse salão de tristeza onde as outras penteiam mágoas”
“A mais bonita” (Chico Buarque), com Bebel Gilberto e Chico
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=57_2f6nuP2Y&hd=1[/youtube]
Claudia Pereira
DONADECASA
donadecasa
compacta!
segredos compreendidos
em xícaras coladas
donadequê?
todos os varais
todos os canais
— com controle —
acostumada as lonjuras de si
pulveriza o ar
ilhado, parado,
semi desesperado
em volta — ou envolta
de gentes
seu coração insistente
converge para o centro
indiferente.
Selma Barcellos
[…]
“Sempre digo que a praia seria um lugar ótimo se não fossem a areia, o sol e a água fria. É só uma frase. Gosto do mar. O diabo é que a gente sempre tem na cabeça um banho de mar perfeito que nunca se repete. O meu aconteceu em Torres, Rio Grande do Sul, em algum ano da década de 50. Sim, crianças, em 50 já existiam Torres, o oceano Atlântico e este cronista, todos mais jovens. O mar de Torres estava verde como nunca mais esteve. Via-se o fundo?
Via-se o fundo.
Víamos os nossos pés, embora a água estivesse pelo nosso pescoço, e como eram jovens os nossos pés. Havia algas no mar? Iodo, mães-d’água, siris, dejetos, náufragos, sereias? Não, a água estava límpida como nunca mais esteve. Os únicos objetos estranhos eram os nossos pés, e como isso faz tempo. Até que horas ficamos na água? Alguns anoiteceram dentro d’água e estariam lá até agora se não tivessem que voltar para a cidade, se formar, fazer carreira, casar, envelhecer, essas coisas.
Como o cronista explica sua aversão ao verão depois de tais lembranças? É que eu não gostava do verão. Gostava de ser mais moço.”
Claro que a maré de saudade do Verissimo me trouxe os deliciosos banhos da infância em Icaraí, os tatuís na areia, a bola de gomos coloridos, o Já-Já de coco … Mas, querem saber? Meu banho de mar perfeito aconteceu há pouco tempo, aqui em Itacoatiara.
Entre um compromisso e outro, resolvi dar um mergulhinho rápido na praia vazia das segundas-feiras. Cenário? Sol e azul em deslimite, mar dormindo, brisa leve, água transparente…
Amigos, foi mergulhar e emergir sorrindo. Simplesmente não conseguia desfazer a expressão. Quem me visse, diria que eu estava lembrando de algo engraçado. Que nada. Nem pensamento eu tinha. Apenas… sorria.
Agenda cancelada, saí caminhando pela orla, vagarosamente, de volta pra casa.
Dizem que é endorfina. Eu chamo de felicidade mesmo.
Itacoatiara (foto de Julie Buckley)
“Dormir no teu colo é tornar a nascer
Violeta e azul, outro ser
Luz do querer
Não vai desbotar, lilás cor do mar
Seda, cor de batom
Arco-íris crepom
Nada vai desbotar
Brinquedo de papel machê.”
“Papel Machê” (João Bosco / Capinan), com João
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=RVSlqIYE0rs#t=146&hd=1[/youtube]
OUTRE
Annie Salager
Des fois, aussi,
tout irisée se
balade naïve
une bulle
en la fraîcheur
du vent,
pourquoi si beau
dehors oh
pourquoi enfermée
elle se dit
et explose
aussitôt
du plaisir
d`exploser
ALÉM
Tradução de Adalberto de Oliveira Souza
Às vezes, também,
bem irisada
vagueia ingênua
uma bolha
na aragem do vento,
por que tão belo
fora, oh
por que aprisionada
ela se diz
e explode
tão somente
pelo prazer
de explodir
“Quem está fora não entra
Quem está dentro não sai…”
“Piston de Gafieira” (Billy Blanco), com Sílvio Caldas
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=JatxVBXO64M&hd=1[/youtube]
Para Mestre André
“Eu quero é botar meu bloco na rua” (Sérgio Sampaio), com ele
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=rsiAN__ii7E[/youtube]
“Marcha da quarta-feira de cinzas” (Vinicius de Moraes / Carlos Lyra), com Toquinho
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=kl6iknBuVNE[/youtube]
Uma semana antes do carnaval começou a atormentar a mãe e a avó. Queria ir fantasiado na matinê de domingo no clube, que era para as crianças, mas também ficava cheia de marmanjos.
Não uma fantasia qualquer, uma fantasia de caubói. Não um caubói qualquer, tinha de ser do seu grande herói de então, Durango Kid, que se vestia todo de preto, com cinturão e revólver prateado na cintura, botas, chapéu e a o lenço também preto cobrindo o rosto. Pena que não podia pedir também o cavalo branco imaculado e fogoso, que empinava e disparava em perseguição aos bandidos. Isso seria exigir demais.
O pai, com seu espírito de porco, tentava confundi-lo dizendo que se o tal Durango Kid era mocinho e estava do lado da lei não precisa andar mascarado. Santa ignorância! Mal sabia ele que se tratava de um truque genial do mocinho, para confundir, surpreender e aterrorizar os bandidos. E como era empolgante quando, nos seriados, ele entrava no esconderijo e logo depois saía transformado no cavaleiro negro, defensor dos fracos e oprimidos, galopando no seu cavalo branco!
Até então, sendo filho e neto único, raramente suas vontades eram contrariadas pela mãe e pela avó. Daquela vez, porém, a madrinha costureira estava atarefada com as encomendas de diversos blocos carnavalescos e outros foliões que eram a grande sensação do carnaval de rua e de salão da cidade, considerado o melhor de toda a região.
Na matinê de domingo teve que se contentar com uma fantasia mixuruca e improvisada de pirata: turbante na cabeça, camisa listrada, um tapa-olho que o incomodava. Se ainda tivesse uma perna de pau e um papagaio no ombro até que podia passar.
Ficou emburrado, sentado à mesa, tomando guaraná, sem vontade de entrar na folia do salão, onde seus amigos se esbaldavam, tentando enfiar um monte de confete na boca um do outro ou acertar o jato de lança-perfume no olho.
Lá pelas tantas resolveu dar uma volta pelo clube e acabou perto da porta de entrada, observando o movimento.
De repente, eis que entra um empertigado caubói de seus quinze ou dezesseis anos, bem mais velho do que ele que acabara de completar sete. Não era lá um Durango Kid, mas era uma bela fantasia de couro cru, com franjas nas mangas e nas calças, o cinturão com dois revólveres com cabo de madrepérola, as botas e o chapéu. Estava mais para Búfalo Bill, mas impressionava.
Não pode deixar de, disfarçadamente e de longe, seguir o caubói, que atravessou todo o clube, cheio de pose, chegou ao salão, mas permaneceu na porta, só espiando.
Depois de algum tempo, deu meia volta e se dirigiu para a sala de jogos, sentou-se numa mesa com outro rapazinho, vestido de marinheiro, e se puseram a jogar xadrez, absolutamente indiferentes ao clima carnavalesco.
Caubói jogando xadrez? Ainda se fosse baralho, como nos filmes, vá lá. Mas um caubói jogar xadrez era como entrar no saloon, encostar no balcão e em vez de uísque pedir um copo de leite! E se era para jogar xadrez, por que a fantasia de caubói?
Ficou tão indignado com o falso caubói que, ao ouvir a orquestra reiniciar após um breve intervalo, resolveu deixar de ser bobo e cair na folia.
Baixou o tapa-olho que estava levantado na testa, sacou o frasco de lança-perfume Rodo Metallico do bolso e se mandou para o salão, onde se reuniu com os amigos e passou o resto da matinê se divertindo a valer, pulando e cantando as marchinhas. De vez em quando, por breves e palpitantes minutos, até mesmo pegou na mão da linda loirinha, filha do Prefeito, com a qual trocava olhares lânguidos na escola e em todos os lugares em que se encontravam.
Ele dizia a todo o mundo que ela era a sua namorada. Talvez ela ainda não soubesse disso, mas por certo desconfiava.
“Cowboy fora da lei” (Raul Seixas / Cláudio Roberto), com Raul
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=3Cy5qKoFyMA[/youtube]