Janeiro de Rio

 

 

 

                        Gilberto Gil tinha e ainda tem razão: o Rio de Janeiro continua lindo!

                        Tragédias urbanas, violência, traficantes que, se aproveitando da ausência do Poder Público, impõem seu jugo a uma grande maioria de trabalhadores e pessoas de bem que habitam nas favelas.

                        Nada disso é capaz de tisnar a beleza avassaladora da cidade, serpenteando entre morros e praias, sua gente morena e sorridente, suas mulheres de perder o fôlego.

                        Há quem não goste dos cariocas, tachando-os de bairristas e arrogantes.

                        E não teriam motivos de sobra para isso?

                        Sempre me dei muito bem com eles (tanto que até me casei com uma). Adoram gozar os paulistas, como adoramos gozá-los. Trata-se de uma rivalidade amorosa semelhante à que mantemos com os avós portugueses e os hermanos argentinos.

                        Às vezes me ocorre se não teria sido um equívoco transferir a capital da República para Brasília. Juscelino, na época, com seu furor desenvolvimentista, tinha muitos e bons argumentos a favor, a maioria deles convincentes.  Mas passados 50 anos, Brasília se tornou uma ilha de cimento e fantasia, afastando (ou pondo a salvo) os governantes e parlamentares do povo, em especial o povo ferino e crítico do Rio de Janeiro, que admite tudo, menos o ridículo. Todos os presidentes, sem exceção, incluindo os da ditadura militar, isolados em Brasília e rodeados por seus acólitos, pensam-se grandes condutores da Pátria, sábios iluminados que nos levarão a um glorioso destino, levantando-nos finalmente do berço explêndido. A democracia se faz de homens comuns (como o era Juscelino), que governam para seus semelhantes, e não das figuras execráveis dos homens providenciais, de tão triste memória.

                        Mas voltemos aos nossos dias de sol e céu azul, a maioria sem uma única nuvem, o mar com as águas tépidas e cristalinas, as caminhadas pelo calçadão, onde revejo Drummond sentado no seu banco (e de óculos novos).

                        E também as maravilhas do centro antigo, a estreita Rua do Ouvidor, por onde andava Machado de Assis, tirando o chapéu às senhoras, a admirar uns braços expostos. A velha Lapa dos boêmios, em que Manuel Bandeira morou tanto tempo. A Ipanema de Vinicius, Tom Jobim e da Bossa Nova. O Leblon, agora de Chico Buarque. A deliciosa Livraria da Travessa, uma livraria realmente de livros, o que pode parecer uma redundância, mas se torna cada dia mais raro.

                       Reconcilhei-me com o mar e me despeço entardecendo  nas pedras do Arpoador, a ver o sol mergulhar lentamente nas águas do mar, deixando no final reflexos avermelhados (que lembram quadros de Monet), como a mão de quem se afoga, acenando o adeus.

                        Saber que a Manuela, ainda agasalhada no ventre materno, mexe-se como uma cabrocha ansiosa por desfilar, cresce e fica a cada dia mais linda. Não demorará muito tempo para que ela talvez esteja aqui ao meu redor, a ver o mesmo sol se pôr.

                        Às vezes, a felicidade é quase possível. Pena que dure tão pouco!

                         Lá se foram esses nossos dias de puro deleite no Rio. Amanhã, São Paulo nos aguarda.

 

 

 

 

Um comentário

  1. Lilian
    20/01/10 at 9:44

    Deixar o Rio em pleno feriado de São Sebastião do Rio de Janeiro e de Ribeirão Preto??? – Que pena!
    Tudo bem, vá para a nossa Milão (alguns se arriscam a compará-la até com NY!).
    Mas colocar os nossos hermanos argentinos no mesmo nível em que estão os queridinhos avós portugueses foi… maldade! Eu queria tanto “voltar” pra Portugal… Ou, até quem sabe, Roma, para, entre outras coisas, ver o Santo Padre todos os dias (ou mesmo apenas saber que ele está por ali), porque adoro as tradições!
    Quanto ao Juscelino, duvido muito que a transferência da capital tenha sido por equívoco. O mal sabe direitinho como tecer suas teias…

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