Máquinas Perfeitas

 

                        Clínica de Fisioterapia Especializada.

 

                        Pouco mais de dez horas da manhã.

 

                        A recepcionista, linda e loura, chega à porta da sala de espera e anuncia:

 

                        — Turma das dez: membros superiores, podem subir; membros inferiores, para o salão debaixo.

 

                        Vê-se que há uma lógica incontestável no direcionamento dos pacientes, acima ou abaixo.

 

                        Os convocados, como um rebanho obediente ao seu pastor, ou como criancinhas do primário, dirigem-se em fila e compenetrados para as salas respectivas, de onde irão do paraíso ao inferno (com maior tempo de permanência neste último), sob o comando de doces fisioterapeutas, todas mulheres, jovens e sorridentes.

 

                        Tirante três ou quatro moços, vitimados em acidentes de trânsito ou do trabalho, nos dois salões se formam verdadeiros conclaves da Academia Brasileira da Terceira Idade (e também da Quarta e até da Quinta), que trocam impressões e informações sobre suas dores.

 

                        Hoje os nomes são técnicos e precisos, diagnosticados por aparelhos de última geração (hérnias de disco, cervical ou lombar, distrofia muscular, artrite, artrose, osteoporose, fibromialgia), mas os males são aqueles mesmos de sempre, os achaques da velhice, que antigamente se chamavam lumbago, espinhela caída, dor nas costas ou nas cadeiras, reumatismo, fraqueza dos nervos ou dos ossos, e doíam tanto quanto.

 

                        No salão de cima, depois de uma sessão de alongamentos, massagens, ultrassom, infravermelho, os dois sessentões, com bolsas de gelo presas nos ombros, que os deixam parecidos com a vestimenta dos jogadores de futebol americano, conversam animadamente.

 

                        — E aí, Agenor, melhorou da bursite?

 

                        — A do ombro esquerdo melhorou bem, mas agora me atacou também o direito… E o seu braço, Pereira?

 

                        — Também um pouco melhor, mas ainda não consigo tocar pandeiro. E um dedo da mão direta deu de armar em gatilho!

 

                        — Nem me diga! Já desisti do violão. A artrite das mãos me mata… Até para jogar baralho está difícil. E o seu colesterol?

 

                        — Com a medicação baixou. E a pressão também está controlada. Só que mijo o dia inteiro.

 

                        A conversa segue por aí, até que depois de uma breve pausa, pontifica Pereira:

 

                        — Mas não existe máquina mais perfeita do que o homem!

 

                        — Ah, isso não existe mesmo. Podem criar o que quiser, mas máquina alguma será capaz de superar o homem, apóia Agenor.

 

                        — Só se for outra máquina criada pelo patrão lá de cima.

 

                        Ao lado dos dois, o cinquentão, que se sente quase um jovenzinho naquela linha de reparo de máquinas perfeitas, acha graça dos comentários, mas não se arrisca a rir.

 

                        Quando ele ri, dói.

 

 

 

7 comentários

  1. Lilian
    11/04/09 at 15:59

    Realmente, Professor, é a mais perfeita máquina que existe.
    O Chefe sabia o que estava fazendo… O que mais me impressiona no corpo humano é a capacidade de digerir as coisas absurdas que insistimos em comer. Algumas vezes, lavando pratos, panelas, me deparo com os restos das coisas que acabei de ingerir. Pego uma folha de papel, limpo cuidadosamente os restos (de queijo, óleo e sei lá mais o que) porque acredito que se aquelas porcarias forem para o encanamento… não sei, não. O encanamento da casa não merece aquilo, mas o meu estômago, sim? Não tem sentido!
    Outra coisa que me fez pensar agora na perfeição de tal máquina foi uma foto do Michael Jackson. Esta talvez seja a criatura que mais já sofreu querendo “corrigir” os erros que o Chefe teria cometido… Todo franzino pessoalmente, mas um verdadeiro “deus”, no palco, quando exercita a sua arte, dominando tudo ao redor.
    Outra máquina perfeita que me ocorreu agora, foi o Baryshnikov, a quem vi dançar a uns quatro, se tanto, metros de distância. Sai do teatro flutuando naquela noite.
    Se as nossas máquinas quando “emperram” dão problema, já pensou a desses deuses?
    E um deles vai jogar contra o meu time amanhã… ai, meu coração!!!

  2. 13/04/09 at 17:12

    Como fisioterapia depois dos 35 anos demora mais de seis meses para ser concluída, em razão da rotatividade elevada das fisioterapeutas, da próxima vez que for pra Ribeirão Preto quero: me sentar ao lado das crianças para esperar a vez de entrar no consultório do pediatra Dabori para checar meu ouvido, fazer cooper com o Milton, me consultar com o Coutinho, fazer aquecimento com a Desirée e medir a pressão com a Denise.

    • 13/04/09 at 23:28

      Caro Rockmann,

      Foi um imenso prazer tê-los, a Tuka e você, aqui em Ribeirão. Mas acho que você está querendo demais… No máximo consultas com o Dabori e o Coutinho, e uma caminhada com o Milton. Fazer aquecimento e medir a pressão com as meninas já é demais!
      Um grande abraço e voltem sempre.

  3. CAROL GAMA
    13/04/09 at 17:29

    Realmente os planos do Rock para um período em Ribeirão Preto estão super dentro da sua rotina, pai…olha, essa máquina é toda imperfeita, mas menos perfeita ainda é aquela tal de consciência, com as neuras, crises e ataques de ansiedade, eu que o diga…te amo, beijo, Carol

  4. Sonia Kahawach
    13/04/09 at 17:49

    Nem me fale dessas coisas!
    Fibromialgia (já até chequei no google para maiores detalhes).
    Bursite…. ainda não atacou.
    Artrose…. no joelho que não me permite ajoelhar nem pra rezar;
    na cervical que me judia a mais não poder.
    Artrite…. nos dedões das mãos que já não abro nem latas com abridor.
    Agora entrei numa crise de labirintite que tive de consultar o entendido no caso e que me sentenciou: parar de fumar (os quase dois maços que se vão por dia); parar de beber (e esquecer os whiskes de final de tarde ou os vinhos saborosos que sempre me atraem).
    Daí foi que perguntei ao tal médico: se não puder ficar com os poucos prazeres que ainda tenho, só vai restar trabalhos chatos e contas pra pagar! Oras!
    Ah, e o tal ainda me encaminhou para uma fisioterapeuta pra fazer hidroginástica apropriada para vertigens. Por incrível que pareça deve ter uns vinte anos que não coloco maiô e nem tenho mais tal peça nos meus guardados. Nem pretendo adquirir!
    Tenho de encarar que são coisas realmente que fazem parte do DIA = Defeitos da Idade Avançando. A máquina é boa, muito bem projetada e desenvolvida e então vai encontrar outras vias para minorar os achaques. Meus pais ultrapassaram os 90 anos com todas essas coisinhas que surjem e acabaram indo por motivos que nunca foram esses. Após os 60, é claro que tem de acontecer uma coisa aqui, outra alí, mas nada que não seja aturável e ultrapassável, não é?
    Importante é manter a cabeça funcionando e tendo certeza de que melhores dias (com menos dores por aqui ou por ali) chegarão em breve.
    V. é o que v. pensa. Acredito nisso!

  5. Sonia Kahawach
    13/04/09 at 18:16

    Máquina mais que perfeita, muito bem projetada e equacionada.
    Lógico que após algum tempo de uso dá uns desacertos, mas nada que não faça parte do DIA = Defeitos da Idade Avançando.
    É tudo uma questão de interpretação.
    Artrose? Meu joelho não dobra nem pra rezar e já faz tempo.
    Artrite? Faz tempo também que não dá pra abrir latas com o abridor manual. Os polegares se ressentem.
    E agora veio uma crise de labirintite nascida sabe-se lá de quanta tensão, depressão (??? não acho que eu tenha e até me admiro pelo bom humor que sempre mantive) e outras coisinhas do gênero, segundo o especialista. E as recomendações que sempre se fazem acompanhar: parar de fumar (eta víciozinho desagradável para os não adeptos), não beber álcool (e lá se vai o whisky do final de tarde e a degustação muito agradável dos vinhos que me atraem e que até são recomendados para a circulação). Foi então que tive de reclamar com o dito cujo: se me tirar os poucos prazeres que tenho, vai restar só trabalhos muito chatos de realizar e contas pra pagar!
    Não concordo.
    V. é o que v. pensa. Acredito nisso e já dei tratos aos pensamentos pra sair sem me abalar muito.
    E ainda me encaminhou para uma fisioterapeuta para hidroginástica própria para vertigens. Legal! Tem pelo menos 20 anos que não coloco maiô e nem pretendo adquirir agora (até porque após os 60 a gente fica bastante feia com a peça).
    Meus pais ultrapassaram os 90 com todos os achaques descritos acima e se foram por motivos que nada tinham a ver com esses imprevistos da caminhada. O negócio é encarar que com o uso a máquina dá umas emperradas, mas nada muito dramático. Continuo crendo que a cabeça funcionando bem, o resto vem por si. E tudo foi muito bem projetado para funcionar apesar dos percalços.

  6. Sonia Kahawach
    13/04/09 at 18:27

    Veja que após os 60 também dá pane quando se usa esta maquininha aqui. Fiz o comentário, remeti e ficou tudo branco. Então achei que não tinha conseguido enviar. E daí tentei reproduzir mais ou menos o que tinha comentado e remeti novamente.
    E agora v. tem aí dois comentários sobre o mesmo tema, da mesma pessoa! Mereço parabéns, já sei. Desculpe os emperros da idade, tá?

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