Lá e cá

 

 

                        A jornalista Carolina Nogueira, que mora em Paris há dois anos, comenta no Blog do Noblat sobre os rigores do vestibular francês, o baccalauréat ou apenas bac, como é chamado por lá.

                        Anota que “Quem já passou pela experiência de um vestibular sabe o que significa a pressão. Mas por aqui, acreditem, é pior. O nível acadêmico da prova não é coisa para amadores. A primeira prova, obrigatória para todos os alunos, é de filosofia. matemática, francês, informática, literatura e metodologia científica são assuntos mais ou menos comuns a todas as carreiras entre as quais o aluno pode optar. Algumas provas, mais específicas, compreendem noções de engenharia, economia, direito, psicopatologias humanas – isso tudo, bem entendido, antes de entrar na universidade. Claro que o ensino secundário daqui é – mais em umas escolas, menos em outras – compatível com a exigência da prova. Mas a cobrança, a pressão e o stress também acompanham o mesmo nível. O fracasso no bac significa, na maior parte dos casos, repetir o último ano do secundário para ter direito a refazer a prova. O que costuma representar, na prática, a desistência do ensino superior.”

                        Uma das mazelas, entre muitas, que nos foram legadas pela ditadura militar é a ruína do ensino público brasileiro, que antes era de muito boa qualidade. Não sou adepto das teorias conspiratórias, mas há quem diga de modo bastante verossímil que o propósito da ditadura era esse mesmo, já que não lhe interessava professores e estudantes intelectualmente preparados e participativos, capazes de se contrapor aos abusos e desmandos, como ocorreu nos primeiros anos do regime autoritário.

                        Perdoem-me a conclusão acaciana (que os nossos Comendadores Acácio não veem), mas sem investimento maciço na educação, ― como o fizeram e fazem todos os países que deram o grande e definitivo salto para o desenvolvimento ― continuaremos a patinar entre os países do terceiro mundo, por mais que os tecnocratas e economistas de plantão nos apresentem suas estatísticas e previsões otimistas.

                        Com o ensino público deteriorado e as escolas particulares, na sua grande maioria, não passando de arapucas comerciais, em que o lucro dos mantenedores figura em primeiríssimo plano, o resultado pode ser medido por algumas das graves considerações sobre o desmatamento da Amazônia feitas pelos alunos que prestaram cá  o Enem de 2008:

“O problema da amazônia tem uma percussão mundial. Várias Ongs já se estalaram na floresta.”

“A floresta tá ali paradinha no lugar dela e vem o homem e créu.”

“Tem que destruir os destruidores por que o destruimento salva a floresta.”

“O grande excesso de desmatamento exagerado é a causa da devastação.”

“Espero que o desmatamento seja instinto.”

“A floresta está cheia de animais já extintos. Tem que parar de desmatar para que os animais que estão extintos possam se reproduzirem e aumentarem seu número respirando um ar mais limpo.”

“A emoção de poluentes atmosféricos aquece a floresta.”

“Os desmatadores cortam árvores naturais da natureza.”

“A amazônia tem valor ambiental ilastimável.”

“Explorar sem atingir árvores sedentárias.”

“A floresta amazônica não pode ser destruída por pessoas não autorizadas.”

“Uma vez que se paga uma punição xis, se ganha depois vários xises.”

“Os dismatamentos é a fonte de inlegalidade e distruição da froresta amazonia.”

“A amazônia está sendo devastada por pessoas que não tem senso de humor.”

“O que vamos deixar para nossos antecedentes?”

“Paremos e reflitemos.”

                        Assim, não apenas  a Amazônia,  mas o Brasil e  todos nós  estaremos irremediavelmente perdidos! Sem perder o “senso de humor”, “paremos e reflitemos”: os nossos “antecedentes” eram bem melhores.

 

 

2 comentários

  1. Lilian
    21/06/09 at 14:09

    E alguns dos nossos mais respeitáveis “antecedentes”, “sobreviventes” do regime militar estão no Poder hoje… mostrando às escâncaras os motivos por que vieram, por que estão lá. Se eu não acreditasse em reencarnação, tudo bem; o grande problema é que acredito. Não havendo reencarnação, seria apenas fechar os olhos, como num sonho, a tudo isto o que ocorre, e deixar que Deus corrija (só Ele para tanto) o que o ser humano vem fazendo, ou, caso Ele não decidisse por uma correção, deixar que tudo se “dilua”, como parece ser ao que conduz a trilha que temos percorrido.
    No colégio, o professor usava o termo “transmigração das almas”, referindo-se à reencarnação. Só me resta torcer para que isto não exista, que seja apenas mais uma “teoria conspiratória”!!! (hoje é o dia!)
    Quanto à Amazônia… Lula (e os estudantes que tiveram suas frases citadas) é quem sabe.

  2. sonia kahawach
    21/06/09 at 16:55

    É impressionante o analfabetismo do pessoal que vem surgindo como “gente grande” em nosso país. Parece que falam em dialeto inexplicável até para quem cursou só primário (antigo).
    Ainda sou do tempo (e não vai tão longe assim) que tínhamos o pré-primário, primário, ginásio e colegial ou clássico e magistério.
    E só Clássico ou Colegial davam direito de acesso à Faculdade.
    Tive de fazer um ano de Admissão após o primário, para poder ir para o ginásio, pois terminei o primário com 9 anos e só podia entrar na próxima etapa aos 11 anos.
    E nos 8 anos de ensino básico, tínhamos aulas inclusive de francês, inglês e latim!
    Mas que bons tempos, pois realmente aprendíamos pelo menos a língua pátria com mais propriedade. Aliás, Português era chamado de Língua Pátria. E sabíamos usar o dicionário, as lições tanto de casa como em classe eram corrigidas e tinha uma parte do caderno com o título “correção”, onde tínhamos de repetir pelo menos 5 vezes as palavras que tínhamos errado. Hoje fico abismada de ver como minhas filhas (que já são maduras) e meus netos então nem se fala, não têm noção de linguagem escrita e/ou falada. Não tiveram aprendizado de forma nenhuma nas escolas (nem pública nem privada). As crianças vão para a escola sem vontade, pensam mais nas brincadeiras do que nas aulas e como dizia minha velha mãe…”vão burros e voltam cavalos”.
    E as professoras também não estão compromissadas com o que levam, não noto que tenha preparação de aulas, não há correção….. enfim o caos.
    É uma pena o que ocorre. Poderíamos ter grandes pensadores, grandes escritores, grandes Homens nesse país tão vasto e rico.
    Mas minha geração não terá tempo para ver alguma modificação e um retorno aos bons tempos de real ensino. Do tempo em que se não estudasse e soubesse, não “passava de ano”. Realmente uma pena tanto desgoverno em todos os âmbitos (educação, saúde, segurança).
    Temos de torcer para que surjam novas lideranças com capacidade de provocar uma reviravolta real para que o país possa realmente ser considerado em crescimento não só econômico-financeiro.
    Pagamos um preço muito alto para o tão nada que temos.

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