Golpe e Ditadura

 

             Euclides Rossignoli

euclides rossignoli

 

 

 

 

 

 

 

No próximo dia 31 de março estaremos meio século distantes do golpe que derrubou o governo do presidente João Goulart. Eu tinha 25 anos, morava em São Paulo e acabara de ingressar na universidade. Era membro do Partido Comunista Brasileiro, a mais importante organização de esquerda da época, que atuava na clandestinidade e era comandada pelo revolucionário histórico Luis Carlos Prestes.

O golpe inaugurou o período da ditadura militar, durante a qual as eleições foram abolidas e cinco generais se revezaram na presidência da República como ditadores. O agrupamento político de esquerda que hoje se encontra à frente dos destinos da Nação, liderado pelo PT, certamente produzirá um bom volume de atos e discursos para maldizer a data.

Será lembrado que o presidente João Goulart, eleito em eleição livre, foi deposto por um golpe de direita liderado pelos militares, porque pretendia fazer grandes reformas em benefício do povo e do País. Será dito que, uma vez expulso do governo o presidente legitimamente eleito, os militares instalaram uma ditadura que durou mais de 20 anos e que, entre outras coisas más, aprisionou lideranças populares, cassou mandatos de parlamentares e outros políticos, acabou com a eleição para a escolha do presidente da República e governadores de estados, interveio em sindicatos de trabalhadores, instituiu a censura à imprensa e às produções culturais, assim como perseguiu, torturou, matou e fez desaparecer pessoas que se dispuseram a lutar pela democracia.

Os mártires da ditadura serão lembrados e reverenciados. Os ditadores e seus seguidores serão amaldiçoados. A verdade histórica, porém, será relembrada e contada na porção e proporção dos interesses daqueles que hoje estão no poder. Isto significa que cederá generosos espaços ao engano e à propaganda. Por exemplo: todos os que sofreram e morreram por obra da ditadura terão sofrido e morrido em nome da sagrada causa da democracia, versão que não tem a evidência dos fatos.

Alguns pedaços dos acontecimentos serão naturalmente silenciados, quando não deturpados. Como governava o País o presidente João Goulart, especialmente no seu último ano de governo? Qual era o agrupamento político mais poderoso no âmbito das forças esquerdistas que apoiavam o presidente? Como se posicionavam as forças que apoiavam Goulart diante da divisão mundial entre o bloco capitalista, liderado pelos Estados Unidos, e o bloco dos países ditos socialistas, governados pelos comunistas e liderados pela então União Soviética? Por que as forças de esquerda e o governo perderam apoio popular para a direita? Após o golpe militar, como se comportaram as forças mais radicais da esquerda? Na ditadura, as primeiras ações armadas contra os militares ocorreram antes ou depois do Ato Institucional nº 5, de dezembro de 1968? Qual era a ideologia dos grupos de esquerda que organizaram a luta armada contra a ditadura? Em que paises foram treinadas as lideranças das forças guerrilheiras que promoveram a luta armada?

As respostas da verdade histórica a essas perguntas não são cômodas para a esquerda bolivariana que hoje governa o País. Compreende-se que ela não se disponha a respondê-las. Ou pelo menos não se disponha a respondê-las com a sustentação dos fatos.

Em 1964, tanto as forças que apoiavam o governo como as forças que lhe faziam oposição não exibiam maior fervor pela democracia. Esquerda e direita travavam uma guerra de vida ou morte para ver quem eliminava o adversário, não para estabelecer um regime verdadeiramente democrático. Venceu a direita.

O partido em que eu militava, o PCB, o grande aliado de Goulart, tinha, como sempre teve, por objetivo chegar à ditadura do proletariado, não à democracia. A democracia era aceitável temporariamente, como meio, não como fim.

 

 

 

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