“ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas…”
“Nalgum lugar” (Zeca Baleiro a partir da tradução de Augusto de Campos do poema de e. e. cummings)
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=yZSRUBeX3SE&hd=1[/youtube]
“ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas…”
“Nalgum lugar” (Zeca Baleiro a partir da tradução de Augusto de Campos do poema de e. e. cummings)
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=yZSRUBeX3SE&hd=1[/youtube]
e. e. cummings
“Autorretrato”
somewhere i have never travelled, gladly beyond
(e. e. cummings )
somewhere i have never travelled, gladly beyond
any experience, your eyes have their silence:
in your most frail gesture are things which enclose me,
or which i cannot touch because they are too near
your slightest look easily will unclose me
though i have closed myself as fingers,
you open always petal by petal myself as Spring opens
(touching skilfully, mysteriously) her first rose
or if your wish be to close me, i and
my life will shut very beautifully, suddenly,
as when the heart of this flower imagines
the snow carefully everywhere descending;
nothing which we are to perceive in this world equals
the power of your intense fragility: whose texture
compels me with the color of its countries,
rendering death and forever with each breathing
(i do not know what it is about you that closes
and opens; only something in me understands
the voice of your eyes is deeper than all roses)
nobody, not even the rain, has such small hands
nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
(tradução: Augusto de Campos )
nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto
teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa
ou se quiseres me ver fechado, eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;
nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade: cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira
(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas
“Hannah e suas irmãs” (Woody Allen)
[youtube] http://www.youtube.com/watch?v=ydu7UXIbdF8&hd=1[/youtube]
Manuzinha de uma queda foi ao chão
e o queixo (que tanto beijo) se abriu
num sorriso rubro, sem graça.
Acudiram três cavalheiros,
todos de chapéu (e coração) na mão.
O primeiro foi seu pai,
o segundo, seu Babu,
o terceiro foi o doutor
que lhe costurou com cinco pontos.
Manuela levantou-se brava(mente)
lá da mesa do doutor,
chorou muito, mas depois passou
e o sorriso claro, com graça
para a boca lhe voltou.
A dor do Babu é que não passava
e ao doutor ele indagou
se também podia costurar-lhe
o coração que sangrava.
“Menininha do meu coração
Eu só quero você
A três palmos do chão”
“Valsa para uma menininha” (Vinicius de Moraes / Toquinho), com os dois
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=5f-T3oUtSHI[/youtube]
“Sob Medida” (Chico Buarque), com Maria Bethânia
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=K6c9KosEut4[/youtube]
Selma Barcellos
Que fantásticas as escolhas de mestre Millôr…
“Vinicius que me perdoe plagiá-lo.
Mas beleza é fundamental.”
O seu semblante, redondo Simpáticas feições, cintura breve, Verde carne, tranças verdes. Lábios rubros de encanto A sua língua, pétala de chama. Nos lobos das orelhas |
Mão branca, mão macia, suave e cetinosa
Com unhas cor de aurora e luz do meio dia
Nas hastes cor de rosa.
Luiz Delfino
Os braços frouxos, palpitante o seio.
Casimiro de Abreu
A dorso aveludado, elétrico, felino
Porejando um vapor aromático e fino.
Castro Alves
Seu corpo tenha a embriaguês dos vícios.
Cruz e Souza
Com mil fragrâncias sutis
Fervendo em suas veias
Derramando no ar uma preguiça morna.
Teófilo Dias
Os olhos sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto
A da terra.
Vinicius de Morais
As curvas juvenis
Frescas ondulações da forma florescente
Imprimindo nas roupas um contorno eloquente.
Álvares de Azevedo
Qualquer coisa que venha de ânsias ainda incertas
Como uma ave que acorda e, inda mal acordada,
Move, numa tonteira, as asas entreabertas.
Amadeu Amaral
De longe, como Mondrians
Em reproduções de revistas
Ela só mostre a indiferente
Perfeição da geometria.
João Cabral de Melo Neto
Que no verão seja assaltada
por uma remota vontade de miar.
Rubem Braga
A graça da raça espanhola
A chispa do touro Miúra
Tudo que um homem namora
Tudo que um homem procura.
Paulo Gomide
Nádegas é importantíssimo
Gravíssimo porém é o problema das saboneteiras
Uma mulher sem saboneteiras
É como um rio sem pontes.
Vinicius de Morais
E todo o conjunto deve exprimir a inquietação e espera.
Espera, eu disse?
Então vou indo, que, senão, me atraso!
Millôr Fernandes
(Millôr Fernandes)
“Pressentimento” (Elton Medeiros / Hermínio Bello de Carvalho), com Roberta Sá
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=3n9SwfHk21c[/youtube]
Adalberto de Oliveira Souza
ENTENDIMENTO
Gestos e
acenos.
Intenções e fatos.
Não há como negar
O que a realidade acusa
O sim, o não, o talvez.
São nuvens
claras e escuras,
é o céu, o mar,
os rios, as montanhas,
o lago e o horizonte.
Há a passagem de algures.
e nem sempre se pode entender
o que se manifesta,
tão claramente.
“Bonita” (Tom Jobikm / Vinicius de Moraes / Gene Lees/ Ray Gilber ), com Tom e Frank Sinatra
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=tEM-4cxrps0&hd=1[/youtube]
Annibal Augusto Gama
Meu amigo, o filósofo Pamplona Tredo, é um homem feio. É mesmo um homem muito feio. Torto, quase sem pescoço, a cara escalavrada, as pernas curtas. Por isso, naturalmente não encontrou até hoje mulher para se casar.
Dei com ele numa esquina, outro dia, muito alegre, rindo com todos os dentes e fazendo gracejos. Pegou-me pelo braço e foi logo me dizendo: “Você viu? Foi adotada a quota racial para os negros. Agora, eles terão preferência para ingressar nas Escolas Superiores, ainda que tenham péssima classificação no vestibular. Uma medida sábia. E mais, adotado tal princípio, ele terá de ir até às suas últimas consequências, com todos os seus desdobramentos. É o que ensina a boa filosofia”.
Não consegui imediatamente entender aonde Pamplona Tredo pretendia chegar. Mas ele prosseguiu: “Haverá logo uma quota para os feios e as feias. É natural. Os feios e as feias que não acham uma mulher ou um homem para casar. E eu serei um dos primeiros a ser contemplado pela quota dos feios”.
Ponderei que, neste caso, a quota podia lhe reservar uma mulher feia, ou mais do que feia.
— Não, senhor! — ele retrucou. Não seria justo, e não obedeceria ao regime de quotas. Ao contrário, estarão reservados para os feios e para as feias as mulheres mais bonitas e os homens mais galantes. E é isto o equilíbrio, porque, compensando a feiúra de um com a beleza de outra, gerarão filhos fisicamente harmoniosos.
Tive de concordar com ele. Afinal, os princípios são os princípios. Não devem ficar a meio caminho. E ele e eu discutimos outros desdobramentos do princípio da quota racial. Como não o adotar também para os absolutamente imbecis?
DE POEMAS E FLORES
Alguns nascem
com dedo verde
outros,
com espírito de porco.
Os poetas nascem
com flores
na ponta da língua.
Como as flores,
os poemas
são de vário feitio
e para todos os gostos.
Singelos e essenciais
como as margaridas,
barrocos e carnais
como as rosas.
Radiantes e vigorosos
como os girassóis,
sombrios e delicados
como as avencas.
Plebeus e pródigos
como as marias-sem-vergonha,
nobres e heráldicos
como as flores-de-lis.
Austeros e viris
como os antúrios,
efêmeros e indeléveis
como as flores do ipê.
Monumentais
como as vitórias-régias,
inebriantes
como as damas-da-noite.
Os poemas,
assim como as flores,
são milagres
que se renovam
diante daqueles
que têm olhos
de ver.
Por isso,
no túmulo dos poetas
há flores
sempre vivas,
ainda que invisíveis.