Annibal Augusto Gama
De vez em quando o meu telefone toca e dizem-me que desejam falar com a Dra. Mônica. Não conheço a Dra. Mônica, mas presumo que ela seja clínica geral. E recorro aqui à Dra. Mônica para vir me tratar de dor do cotovelo e de uma coceira nas costas, em lugar que os meus dedos não podem alcançar. Ela me encontrará encostado do umbral da porta, esfregando-me. E prometo-lhe que mandarei aviar a sua receita e tomarei escrupulosamente as pílulas que me recomendar. Prefiro, porém, que me receite placebos.
A vida é feita de falsos remédios, que são tão eficazes como os verdadeiros. E já se dizia que o que não mata cura.
De enganos e verdades vamos vivendo. A soma dos enganos e das verdades equivale-se.
Nestes meados de setembro, o calorão já chegou. As árvores ainda não se despiram das folhas, mas alguns ipês já estão florindo. O meu filho Antonio Carlos trouxe-me a fotografia que tirou de um ipê amarelo, à porta da sua casa, todo garrido.
Se a Dra. Mônica me curar, prometo-lhe uma gorda recompensa. Mas acho que sou incurável.
Diz Pascal que é preciso fazer bom uso das doenças. E que se permanecemos reclusos em nossas casas, nada nos acontecerá. Quanto a isso, contesto-o. Dentro das casas tudo pode acontecer.
Sucede-me que abro uma porta e olho para fora. Lá vem aquela loiraça rebolante. Digo-lhe: “Fique ai, parada, para que eu te contemple, ipê florido”.
Mas ela vai embora, e suas flores despetalam, caindo na calçada.
Aguardo a noite, que é outra mulher, com os seus cabelos negros.
No escuro do quarto, acendo uma velinha para os meus santos de barro. Eles cochilam, e perturbo-os com os meus pedidos.
O que me falta é você, você, você, minha amada…
E outra vez que me telefonarem chamando a Dra. Mônica, direi que ela não atende mais.
Ah, as mulheres não atendem nunca!
Se me atendessem, eu não estaria tão sozinho.
Dra. Mônica, por favor, receite-me um placebo que substitua a vida!
Mas a Dra. Mônica faz ouvidos moucos. O bom é que ainda me restam as pílulas de vida do Dr. Ross, que fazem bem ao fígado de todos nós.
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