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“O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é em mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há, e do que não há em mim.”

 

 

“O quereres” (Caetano Veloso), com ele e Maria Gadú

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Todas as cartas de amor são ridículas…

 

 

Fernando Pessoa e Ofélia de Queiroz 2

 

Por artes de Cupido ─ ou quem sabe de Santo Antônio, meu santo xará e casamenteiro ─ chega-me exatamente no “Dia dos Namorados” — e na véspera dos 125 anos de Fernando Pessoa, que também era Antônio e nasceu em 13 de junho de 1888 — o livro que encomendara à Livraria Cultura, “Fernando Pessoa & Ofélia Queiroz”, pelo qual havia sido capturado desde a entrevista a que assisti com a escritora e jornalista Bia Corrêa do Lago, umas das organizadoras da edição (veja AQUI)

O livro é primoroso, em todos os sentidos, edição, conteúdo, material iconográfico. Pela primeira vez se tem a correspondência completa trocada entre Fernando Pessoa e Ofélia Queiroz ao longo do seu relacionamento conturbado, de 1919 a 1935. São 348 cartas transcritas integralmente, das quais 156 inéditas, e no final a reprodução de excelente qualidade dos manuscritos de Pessoa.

Bia e o marido, Pedro Corrêa do Lago, arremataram num leilão em Londres, no ano de 2002, sem disputa alguma, as 48 cartas de Fernando Pessoa dirigidas a Ofélia, e depois, já apaixonados pela história dos dois, arremataram a outra parte da correspondência amorosa, constituída pelas cartas de Ofélia, em número muito maior, quase 300!

Dou-lhes a palavra, na ótima introdução que assinam em conjunto, “Memória viva de um passado morto”:

 

“A leitura da correspondência agora completa revela plenamente tanto a ansiedade amorosa da jovem lisboeta quanto a distância crescente que vai se estabelecendo por parte de Pessoa, numa relação que talvez só pode ser realmente tida como namoro na chamada “primeira fase” do romance, que dura um ano (novembro de 1919 a dezembro de 1920). Seguem-se quase nove anos de afastamento quando ocorre o reencontro em 1929. O relacionamento, agora requentado, evidencia desde a retomada que nenhuma das partes guarda as mesmas ilusões da década anterior. Muitos contatos são feitos agora por telefone e, a partir de janeiro de 1930, o diálogo epistolar — já desigual — é rompido por Pessoa e torna-se praticamente um monólogo de Ofélia.

Quando começam sua relação, em 1919, Fernando Pessoa tem 31 anos e Ofélia 19 para 20. Alegre e viva, além de graciosa e elegante, Ofélia revela-se nas cartas como uma típica moça romântica de sua época, iludida pela vida que ainda não conhece. Apesar de inteligente e articulada, partilha da desinformação e de preconceitos característicos de moças de classe média portuguesa no começo do século. Seu sonho é óbvio. Casar e constituir família, e manter com o eleito a relação privilegiada que lhe parece o único caminho seguro para a felicidade.

A postura de Fernando é muito diferente. É possível que se iluda, ainda jovem, com a hipótese de formar um par tradicional com uma moça virgem e casadoira, que lhe traga não apenas a satisfação sexual que imagina como uma bem regrada vida doméstica, semelhante à que de certa forma conheceu em sua própria família. Verdadeiramente atraído pelo frescor de uma moça ingênua, conserva esperança de adequação a um relacionamento amoroso como aqueles que pensa que os outros têm.

Não cabe aqui estender-se novamente em especulações — como muitas vezes ocorrido — sobre as preferências sexuais ou as fantasias do poeta, exercício inútil após todo tipo de afirmação ter sido aventada nas últimas décadas a partir dos mais tênues indícios. Um fato parece, no entanto, incontestável: o da extrema timidez de Fernando Pessoa com mulheres fora de sua família. O fato de seus poucos íntimos não lhe terem conhecido nenhuma outra senão Ofélia demonstra, no mínimo, que, com raiz num possível interesse reduzido por mulheres ou ainda uma timidez causada por variados complexos, Fernando Pessoa não parece ter devotado muito tempo e energia à procura amorosa. Tampouco são conhecidas quaisquer ligações homessexuais, e muitos supõem que tenha morrido virgem aos 47 anos.”

 

A arte e os heterônimos de Pessoa interferem no relacionamento. Álvaro de Campos — que assinaria depois o célebre poema “Todas as cartas de amor são ridículas”, escrito em 1935, apenas um mês antes da morte de Fernando Pessoa, e cujo recorte da publicação em jornal, no ano 1937, foi conservado por Ofélia junto com suas cartas — não gostava de Ofélia. E ela, entrando no jogo, diz que também não gostava do engenheiro e não o queria frequentando-lhes a casa depois que Fernando e ela se casassem!

Quando rompem definitivamente, é Ricardo Reis quem liga para Ofélia para lhe comunicar, em nome do Sr. Fernando Pessoa, que este estará incomunicável durante algum tempo.

Sempre achei Bia Corrêa do Lago uma mulher fascinante. Inteligente, simpática, graciosa, como revelam as entrevistas literárias que conduz com grande brilho no canal “Futura”.

Numa delas, o galante António Lobo Antunes lhe disse no encerramento que era encantadora e que o marido dela devia ser um homem feliz.

Disso não tenho nenhuma dúvida.

“(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)”

 

 

Vanessa Mata Tom Jobim

 

 

vanessa da mata

 

Ainda não havia assistido ao show em que Vanessa da Mata interpreta canções de Tom Jobim, o que fiz ontem por um canal de TV que transmitiu ao vivo a apresentação em Ipanema.

O projeto “Viva Tom Jobim”, patrocinada pela “Nívea” é uma homenagem aos 50 anos do lançamento do primeiro disco solo do Maestro Soberano, “The Composer of Desafinado Plays”, gravado pela “Verve”, em Nova York, no ano de 1963.

Pois apesar da denominação do projeto, de bons músicos acompanhando-a, do belo cenário, o que vi e ouvi foi Vanessa, fazendo jus ao nome dela e ao do disco quinquagenário, tentando matar Tom Jobim, desafinando, semitonando, e outras coisas mais. Ficou evidente não estar à altura das nuances melódicas e do refinamento das músicas de Tom.

Não gosto dela como cantora, admito.

Quando surgiu, o timbre algo parecido com o de Gal Gosta me despertou a atenção, mas logo percebi que se tratava de uma cantora muito limitada, a despeito do grande sucesso de público e de crítica, o que, aliás, não significa absolutamente nada. Sou desafinado, mas meus ouvidos não são moucos.

Apesar disso, cheguei a me indagar se não seria mera implicância ou intolerância minha. Mas eis que, sem nada haver comentando antes com ela, recebo um e-mail de uma querida amiga e colaboradora deste blog (e que encanta quando canta) dizendo-me que sentia exatamente o mesmo. 

Até Caetano Veloso, que participou brevemente do show, parecia sem graça, pouco à vontade, cantando num tom (ou Tom), que não era o dele.

Vanessa só não mata de vez Tom Jobim porque ele é mesmo imortal.

(A cara do Tom na foto acima não parece preocupada?)