Meditações de um chato

 

 

 

               O que será, afinal, uma pessoa chata?

               Como definir um chato?

               No seu dicionário, Houaiss (que era um chato culto) apenas nos itens 6 e 7 do vocábulo apresenta o que qualifica como “Derivação: sentido figurado. Uso: informal.    6     que ou o que é maçante, enfadonho ou insistente   7     que ou o que aborrece, perturba ou preocupa”.

                Muito melhor do que isso são as frases antológicas a respeito do chato, entre as quais aquela de Millôr Fernandes que me parece certeira: “Chato é o indivíduo que tem mais interesse em nós do que nós temos nele.”.

               O General João Baptista Figueiredo, último ditador do regime militar instaurado em 1964 (e que ao deixar o poder nos pediu que o esquecêssemos), provindo de uma família tradicional de militares, tinha um irmão escritor, um bom escritor, aliás (toda família tem uma ovelha negra).

               Guilherme Figueiredo, além de várias peças inspiradas na temática mitológica, escreveu um livro muito divertido, “Tratado Geral dos Chatos”, com algumas máximas deliciosas: “Cada indivíduo tem o chato que merece. É impossível chatear um chato. Dois chatos da mesma espécie não se chateiam.”.

               Tenho pensado sobre isso com alguma frequência ultimamente em razão de uma idiossincrasia que vem me tomando e talvez me tornando um chato.

               Há pessoas admiráveis — e que sinceramente admiro — por seus dotes intelectuais e seu talento, pelo exercício da cidadania, por sua correção e generosidade, enfim por diversas qualidades excelsas, e que, entretanto, para meu opróbrio, parecem-me chatos de galocha.

               Não cometerei a injúria de nomeá-los, mas eles pululam por aí diuturnamente, nos jornais, na televisão, na internet, agraciando-nos com suas virtudes pessoais e cívicas, com a santa indignação, a sapiência, o exemplo a ser seguido.

               Mas como são chatos!

               Os meios de mídia, com raras exceções, e também os órgãos governamentais, sem exceção, estão imbuídos do propósito de nos educar, de nos tornar cidadãos conscientes e éticos, de nos ensinar a criar os filhos, cuidar da saúde, ser bom vizinho e bom companheiro, não gastar à toa, e até mesmo a morrer.

               O chato provavelmente seja eu, devo admitir.

               Consolam-me estas duas outras frases, a primeira de Emerson e a segunda também do nosso Millôr:

               “Todo herói torna-se chato.”

               “Como são admiráveis as pessoas que nós não conhecemos bem.”

 

 

 

 

 

3 comentários

  1. brenno
    22/08/12 at 18:28

    Falou tudo… e sem ser chato! (porque quem fala tudo, geralmente o é, ué…)

  2. 22/08/12 at 20:37

    Dos fisicamente chatos – “têm um uísque na mão e nossa lapela na outra” – e dos verbalmente idem – “não sabem que “Como vai?” é um cumprimento, não uma pergunta”… livrai-nos, Senhor! (repetir três vezes; novena também é de grande valia)
    Beijocas!

  3. Lilian
    23/08/12 at 22:49

    Não creio que os heróis sejam chatos… Admiro Alexandre, Ulisses e Aquiles; nenhum deles me leva a pensar em chatice – ao contrário, a imortalidade lhes deu o privilégio de viver numa constante aventura!

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