Posts from dezembro, 2012

 

 

 

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O tempo e o templo

 

 

cavalo a galope

 

 

                        Ao longo do ano o tempo galopara tão veloz quanto um cavalo indômito e agora se detinha brevemente, como a recobrar-se, diante do último obstáculo. Não que lhe fosse difícil transpô-lo. Apenas uma pequena fenda que ele saltaria sem muito esforço para de novo se pôr a galope pelo campo verdejante do outro lado, deixando definitivamente para trás a clareira do passado.

                        Sentia-se assim, parado na frente do templo a observar a sua fachada majestosa, o entra e sai da multidão de fiéis, todos sorridentes e em estado de graça.

                        Não era um homem sem fé, achava mesmo que não se vive sem algum tipo de crença, ainda que fosse na inutilidade da fé, o que não deixa de ser uma forma de fé.

                        Mas pouco frequentava o templo, cuja suntuosidade o inibia. Gostava dos pequenos templos do seu tempo de menino, em que se sentia agasalhado e reconhecido. Agora, eram construções gigantescas e labirínticas, sempre lotadas, em que se perdia e angustiava.

                        Com a aproximação do Natal e do fim de ano, que sempre o comoviam — antes com alegria incontida, agora com inevitável melancolia — viu-se de repente defronte do templo, para onde se dirigira quase sem se dar conta.

                        Anoitecia e a lua já despontava, ofuscada pela iluminação feérica do templo.

                        Acabou entrando, a passos lentos e reverenciosos, enquanto sofria os esbarrões do borbotão de fiéis, indo e vindo.

                        Lá dentro, a amplitude e a claridade lhe trouxeram à lembrança o impacto que havia sentido ao entrar pela primeira vez na Basílica de São Pedro. Depois de várias semanas a viajar pela Europa, visitando inúmeras igrejas barrocas, magníficas, porém massacrantes e sombrias, o esplendor renascentista da Basílica, com suas cores e luzes, fora uma experiência de redentora humanidade.

                        Neste templo, entretanto, não se sentia liberto nem humano, e sim um autômato desnorteado.

                        Perambulou pelos corredores imensos, detendo-se vez ou outra diante dos altares laterais. No centro do templo, vislumbrou um velho de barbas brancas, cercado de criancinhas.

                        Começou a se sentir tonto e asfixiado, e sem fazer oferenda alguma buscou a saída, aflito.

                        Enquanto se afastava, olhou para trás e viu a pairar sobre a abóboda do templo a Estrela de Belém piscando, com os dizeres garrafais logo abaixo:

 

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UM SANTO NATAL E UM PRÓSPERO ANO NOVO