“All of me” (Gerald Marks / Seymour Simons), com Billie Holiday
http://www.youtube.com/watch?v=4P0hG3sD0-E
“All of me” (Gerald Marks / Seymour Simons), com Billie Holiday
http://www.youtube.com/watch?v=4P0hG3sD0-E
Senhores, à guisa de consulta, estaria em processo alguma mutação genética na voz das mulheres? Por que tantas com timbre infantilizado, esganiçado, similar a gravações distorcidas de testemunhas? Tortura ouvir certas cantoras (só Billie podia), candidatas, atrizes, repórteres, apresentadoras, entrevistadas anônimas nas ruas e, céus!, manicures gasguitas conversando por sobre a clientela imobilizada pelos alicates.
Tem uma comentarista de economia que me leva a desentendimento diário com tevezinha, velha companheira para “furos de reportagem” que mantenho ao lado do computador da Redação. Fica ali, a fofa, batendo parada e baixinho na mesma estação, até que entra a criatura do Dow Jones com aquela voz exasperante e, como se não bastasse, com o cacoete de ralentar o final de cada frase, escandindo as sílabas. Levo alguns minutos para perceber a jugular inflando e aí… sobra para tevezinha. Mute no queixo.
Tal sensibilidade a latomias e cacarejos femininos estridentes não vem de hoje. Um dos meninos, ainda no ninho, ao descobrir a neura, sem que eu percebesse mudava tevezinha para um canal japonês e saía do ambiente. Escondia-se, às gargalhadas, esperando que eu desse pela coisa e partisse para cima dele com a sapatada voadora. Que nunca acertei, diga-se.
Estou sozinha em minha aversão e percepção do agravamento do problema?
Selma Barcellos
“Lembra de mim” (Ivan Lins / Vitor Martins), com Ivan
Adalberto de Oliveira Souza
LEMBRANÇAS
Doces e amargas.
Lembranças silentes,
eloquentes e loquazes.
Lembranças insistentes,
vagas e sutis.
Lembranças inúteis?
Lembranças pertinentes e outras adequadas,
ponderáveis e imponderáveis,
lembranças áridas
e desérticas.
Lembranças populosas,
lembranças eróticas
e erráticas.
Lembranças ressaibos
de arrependimentos,
puras lembranças
insaciáveis,
indissociáveis
ao cotidiano.
Lembranças reclusas
e escusas.
Lembranças sórdidas e
inconfessáveis.
Lembranças caroáveis,
duras e determinantes.
Lembranças inassociáveis
à alguma realidade.
Lembranças constantes
e sem importância nenhuma e,
às vezes, exorbitantes.
Lembranças remotas e
recentes.
Lembranças imprescindíveis,
cruéis e amenas,
felizes ou infelizes
afeitas à saudade ou
ao esquecimento.
Lembranças insolentes,
ou carentes.
Lembranças aparentemente
neutras, mas fatais.
Lembranças,
meramente lembranças.
Annibal Augusto Gama
De vez em quando o meu telefone toca e dizem-me que desejam falar com a Dra. Mônica. Não conheço a Dra. Mônica, mas presumo que ela seja clínica geral. E recorro aqui à Dra. Mônica para vir me tratar de dor do cotovelo e de uma coceira nas costas, em lugar que os meus dedos não podem alcançar. Ela me encontrará encostado do umbral da porta, esfregando-me. E prometo-lhe que mandarei aviar a sua receita e tomarei escrupulosamente as pílulas que me recomendar. Prefiro, porém, que me receite placebos.
A vida é feita de falsos remédios, que são tão eficazes como os verdadeiros. E já se dizia que o que não mata cura.
De enganos e verdades vamos vivendo. A soma dos enganos e das verdades equivale-se.
Nestes meados de setembro, o calorão já chegou. As árvores ainda não se despiram das folhas, mas alguns ipês já estão florindo. O meu filho Antonio Carlos trouxe-me a fotografia que tirou de um ipê amarelo, à porta da sua casa, todo garrido.
Se a Dra. Mônica me curar, prometo-lhe uma gorda recompensa. Mas acho que sou incurável.
Diz Pascal que é preciso fazer bom uso das doenças. E que se permanecemos reclusos em nossas casas, nada nos acontecerá. Quanto a isso, contesto-o. Dentro das casas tudo pode acontecer.
Sucede-me que abro uma porta e olho para fora. Lá vem aquela loiraça rebolante. Digo-lhe: “Fique ai, parada, para que eu te contemple, ipê florido”.
Mas ela vai embora, e suas flores despetalam, caindo na calçada.
Aguardo a noite, que é outra mulher, com os seus cabelos negros.
No escuro do quarto, acendo uma velinha para os meus santos de barro. Eles cochilam, e perturbo-os com os meus pedidos.
O que me falta é você, você, você, minha amada…
E outra vez que me telefonarem chamando a Dra. Mônica, direi que ela não atende mais.
Ah, as mulheres não atendem nunca!
Se me atendessem, eu não estaria tão sozinho.
Dra. Mônica, por favor, receite-me um placebo que substitua a vida!
Mas a Dra. Mônica faz ouvidos moucos. O bom é que ainda me restam as pílulas de vida do Dr. Ross, que fazem bem ao fígado de todos nós.
[youtube] http://www.youtube.com/watch?v=U6WLeqktFK4[/youtube]
“Se é tarde me perdoa” (Carlos Lyra / Ronaldo Bôscoli), com Gal Costa
Como disse Selma Barcellos,
“Com uma lua dessas ele se vai…
Mas a manhã será luminosa.”
E depois do triste adeus
ficarão para sempre as lembranças…
“Lembranças” (Benil Santos / Raul Sampaio), com Miltinho e João Bosco