A vida começa e acaba todos os dias

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

8:00 – O despertador toca. Desligo com vontade de dormir. Não posso.

8:15 – Escovo os dentes e vejo que há um novo vazamento no banheiro. Interfono para o porteiro. “Problema no prédio todo. Estamos sem água”. Esbravejo. Fico puta. Penso em desmarcar todos os compromissos e voltar para a cama. Não posso.

8:30 – Tomo um café, fumo um cigarro.

8:30 – Ligo o computador, checo os e-mails. Revejo a lista de itens por fazer. Começo pagando o boleto da Receita Federal (preciso fazer a segunda via do passaporte). Transfiro o dinheiro para a conta de um locador de apartamentos no Rio de Janeiro (Eba! Vou ver o mar em dezembro). Dou parabéns aos aniversariantes no Facebook. Respondo a algumas pessoas…

10:00 – A massagista chega para me apertar na drenagem linfática. O batuque constante da reforma do apartamento de cima me irrita.

11:00 – Recebo um telefonema com um briefing para um roteiro.

11:30 – Recebo a proposta de um freela na próxima semana. Minha agenda está disponível (mais trabalho!).

12:00 – Ligo para o cliente do primeiro roteiro para tirar dúvidas. Acho que não vai ser difícil e marco para fazer as unhas (há mais de um mês não consigo ir). Começo o roteiro.

12:30 – Recebo por e-mail mais um roteiro a ser feito. Penso em cancelar as unhas.

12:50 –  Com o roteiro semi-pronto, almoço um lanche rápido no Shopping, recuso o convite de almoçar com a irmã (tenho que trabalhar).

12:55 – Ligo para os meus pais. Estão bem. Digo que amanhã vou para Ribeirão. Preciso vê-los (não volto para lá há quase dois meses).

13:20 – Faço as unhas.

14:00 – Termino e volto para casa.

15:00 – Reviso o roteiro e envio para o cliente. Hora de começar o próximo

15:45 – Recebo um e-mail do amigo GPeteanH “Recebi esse e-mail agora e estou muito triste. Como não estou em São Paulo, resolvi repassar a triste notícia… o Violla faleceu.”  Choque…

 

PAUSA – Marcelo Violla era um amigo. Um grande amigo dos meus amigos.  Portanto, meu amigo. A última vez que nos vimos foi há duas semanas no encerramento da peça “Meio Lá, Meio Cá”. Junto com Murilo Inforsato e GPeteanH, ele participou da criação da peça durante quase dois anos. Nos encontramos várias vezes. Trabalhamos juntos. Ele foi o nosso iluminador no “Prosa Afiada Conta Vinícius de Moraes”. Era um cara talentosíssimo. Trabalhava para várias companhias teatrais. Entendia muito de luz e de toda a cena teatral. Muito querido no meio das artes. Um dos mais criativos técnicos que vi trabalhar. Junto com LosbobosBobos estava cheio de planos. Estava investindo em fazer trilhas, queria outros caminhos. Na ocasião que nos vimos pela última vez eu estava sem ingresso para a peça deles. Ele me deu um de seus ingressos destinado à sua família e me disse “você vai sentar junto com a minha família”. Eu brinquei: “hoje sou team Violla”. Vi sua mãe, sobrinhos, irmã. Acho que as últimas coisas que falei foram: “Obrigada” “Tá feliz?” e “Parabéns”.

 

15:46 – Ligo para o Murilo para saber como ele está, descobrir notícias. Ele não me atende.

15:47 – Ligo para o GPeteaH com o mesmo objetivo, ele também não me atende. Sinal de que as coisas não vão bem.

15:48 – Tento descobrir algo pelo Facebook. É verdade. As pessoas começam a se manifestar.

15:50 – Decido ligar para a Laura, mulher do Murilo. Ela me conta toda a história. Não se sabe a causa da morte. Violla simplesmente foi encontrado morto na rua. Choque. Murilo está bem, em choque. GPeteaH está tentando ficar bem. Os amigos estão se mobilizando para falar com a família. Nada se sabe sobre velório. O corpo dele ainda está no hospital.

16:00 – Divido a triste notícia com minha irmã.

16:10 – Ligo de novo para o Murilo. Desta vez, converso com ele. Tudo muito triste. Muito súbito. Muito difícil de descrever. Tento avisar outros amigos em comum, troco algumas mensagens. Fico sem ação.

16:20 – Tento me concentrar no segundo texto a ser entregue. Resolvo fazer somente um rascunho. Nada deve ser lido, entregue hoje. Não dá. Fumo, tomo café, volto para o computador, revejo as fotos do Violla. Fico num ciclo doido pensando no que devo pensar, pensando no que devo dizer, pensando no que devo fazer….

 

PAUSA

 

18:24 – Recebo uma mensagem de texto no celular: “Queridos, a Manu chegou. Cheia de saúde tanto que já está mamando. Estamos no hospital São Luiz. Obrigado pelo carinho, beijos da Rê, Cauê e Manu”. A filhinha da Rê nasceu!!!!!! Bem! Saudável! Linda! Quero visitar! Quero pegar no colo! Quero…

18:25 – Repasso as notícias. Checo com amigos mais próximos como está a Renata. Ela está bem, um pouco tonta, teve que fazer cesárea. Decido que é melhor não ir vê-la hoje. Muita notícia boa para ela. Precisa descansar para dar leite para a Manu.

22:45 – Penso no Violla que se foi. Na linda Manuela que chega.

 

 

Bell Gama

Outubro de 2012

 

 

 Marcelo Violla (de verde) junto com a trupe do “Prosa Afiada”

 

OBS – Pensei muito antes de escrever esse texto. Mas, todos os amigos de Violla estão fazendo questão de homenageá-lo deixando por escrito nossa gratidão por sua existência. Essa é minha singela homenagem. Hoje não tem luz no palco. Tem estrela nova no céu. #RIPViolla

Eu também não poderia deixar passar em branco o nascimento da querida e esperada Manuela, filha da minha querida amiga Renata Ferraz e do Cauê Dias. Sou madrinha de casamento deles. Sou fã do amor deles. Sou fã de tudo que eles fazem. Com a Manu, o orgulho é ainda maior. Tudo de melhor

 

Cauê, Renata e Manu logo após se encontrarem pela primeira vez (roubei a foto da mamãe) 

 

 

 

7 comentários

  1. Brenno
    29/10/12 at 14:22

    Pois é, Bellzinha, nada mais expressivo que o cotidiano. Nele mora o simples e transitam os acontecimentos. Porque o dia é feito de acontecimentos… como a vida (que começa e acaba todo dia).

  2. 29/10/12 at 17:17

    Assim é, Bell. Nossa paisagem encolhe quando se vai um Violla. Em contrapartida – contra as partidas – , refloresce através da Manu.

    Beijocas carinhosas.

  3. Brenno
    29/10/12 at 17:48

    De novo o cotidiano
    sempre do mesmo tamanho,
    sempre do mesmo formato,
    como se fosse um teatro
    onde passa a mesma peça
    que onde acaba começa
    e onde começa acaba
    quando a cortina desaba.
      
    No palco os mesmos atores.
    O tema: dores e amores.
    O enredo: repetido.
    O roteiro: conhecido.
      
    História de amor e crime,
    acho que já vi esse filme.
    É uma reprise… e, sim!
    Lembro que eu morro no fim.

  4. 30/10/12 at 10:42

    Tio Brenno e Selminha, obrigada pela força. Tio, lindo poema! É seu? É novo! Parece sob medida!
    beijo grande 

  5. No palco os mesmos atores.
    O tema: dores e amores.
    O enredo: repetido.
    O roteiro: conhecido.

    BELL,ACHO QUE O BRENNO  retratou bem, estas coisas da  VIDA!!!!!!!  QUE  NOS PREGAM UMA PEÇA  A CADA DIA!!!  SÓ  QUE A VIDA  CONTINUA!!!!!!!  BJO  BELLL….LINDA HOMENAGEM….   AO VIOLLA!!!!

  6. sonia kahawach
    31/10/12 at 13:35

    Acho incrível o poder que a Bell tem de escrever sobre vida e morte com grandes abalos e choques assim como repleto de ternura e afago. Quando pego qualquer texto dessa menina não consigo parar de ler, vou até o fim e queria ainda continuar. Quando sair seu livro quero ser das primeiras a adquirir e vou tê-lo à cabeceira, com certeza. 

  7. 05/11/12 at 11:58

    Sonia querida, muuuuito obrigada pelos elogios! Fizeram o meu dia muito mais feliz! Maria, muito obrigada também! beijos a todas

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