ELUDIR
(DES)ILUSÕES
ILUDE
[youtube] http://www.youtube.com/watch?v=GBpxm1h0AMM[/youtube]
Adalberto de Oliveira Souza
Adalberto de Oliveira Souza, poeta, escritor, professor, mestre e doutor de línguas neo-latinas, alma peregrina de artista e uma porção de outras coisas mais, sobretudo o grande e querido amigo meu e do Brenno desde a prisca e saudosa era do curso Clássico no Otoniel Mota, que 25 anos atrás foi viver e lecionar em Maringá, reapareceu de repente, não mais do que de repente no Estrela Binária. E mandou de presente este poema que fez especialmente para o blog.
Vai se tornar colaborador permanente e há de merecer uma apresentação à altura que, chegado de viagem e ainda meio fora de órbita, não consegui escrever agora.
E não via a hora de publicar o poema.
Não, não vá embora, Adalberto.
A casa é sua.
Possua-a…
Homenagem à Estrela Binária
Ora direis,
sob tantas estrelas
luzindo esparsamente,
limpidamente significando
e nem tanto e nem tento explicar.
Ora ouvireis,
clareando ofuscantes,
vagas e sensivelmente,
do tempo e da distância,
as massas estelares,
as estrelas violentas,
as estrelas cadentes,
os eclipses vários
preocupantes.
Hora a hora,
só indo embora,
sempre, sempre.
A que sabe o seio?
O seio a tudo sabe
doce de leite
doce deleite.
A que veio o seio?
O seio é o veio de tudo
tez de veludo
remanso agudo.
O seio é puro anseio
do menino que quer vê-lo
da sina da menina ser mulher.
Teu seio em minha mão
não é só o seio-ideia de Platão,
é o mundo todo que sabia, não sei e sei-o.
Sob uma estrela pequenina
Wisława Szymborska
Me desculpe o acaso por chamá-lo necessidade.
Me desculpe a necessidade se ainda me engano.
Que a felicidade não se ofenda por tomá-la como minha.
Que os mortos me perdoem por luzirem fracamente na memória.
Me desculpe o tempo pelo tanto de mundo ignorado por segundo.
Me desculpe o amor antigo por sentir o novo como primeiro.
Me perdoem, guerras distantes, por trazer flores para casa.
Me perdoem, feridas abertas, por espetar o dedo.
Me desculpem os que clamam das profundezas pelo disco de minuetos.
Me desculpe a gente nas estações pelo sono das cinco da manhã.
Sinto muito, esperança açulada, se às vezes me rio.
Sinto muito, desertos, se não lhes levo uma colher de água.
E você, falcão, há anos o mesmo, na mesma gaiola,
fitando sem movimento sempre o mesmo ponto,
me absolva, mesmo se você for um pássaro empalhado.
Me desculpe a árvore cortada pelas quatro pernas da mesa.
Me desculpem as grandes perguntas pelas respostas pequenas.
Verdade, não me dê excessiva atenção.
Seriedade, me mostre magnanimidade.
Ature, segredo do ser, se eu puxo os fios de suas vestes.
Não me acuse, alma, por tê-la raramente.
Me desculpe tudo, por não poder estar em toda parte.
Me desculpem todos, por não saber ser cada um e cada uma.
Sei que, enquanto viver, nada me justifica
já que barro o caminho para mim mesma.
Não me julgue má, fala, por tomar emprestado palavras patéticas
e depois me esforçar para fazê-las parecer leves.
(tradução de Regina Przybycien)
Escrevi o poema do outro post abaixo há algum tempo, mas nestes tempos de fim de ano ele sempre me atropela a mente, antropofagicamente.
Daí me lembrei daquela antiga ilustração de um velhinho de barbas brancas passando o bastão ou a ampulheta para um menino, e me saíram estes outros versos.
Nem mágico, nem trágico,
é autofágico o fim de ano.
Depois de devorar-se
(e também a nós)
regurgita atroz
o mesmo engano
(em que vamos nós).
O poeta Lêdo Ivo
(menos lido que devido)
fez a viagem só de ida
lá em terras da Espanha
neste triste fim de ano.
Assim é a lida da vida:
sempre nos apanha em ledo engano!
[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=mcCsoscEz8Y[/youtube]
A passagem
Lêdo Ivo
Que me deixem passar – eis o que peço
diante da porta ou diante do caminho.
E que ninguém me siga na passagem.
Não tenho companheiros de viagem
nem quero que ninguém fique ao meu lado.
Para passar,exijo estar sozinho,
somente de mim mesmo acompanhado.
Mas caso me proíbam de passar
por seu eu diferente ou indesejado
mesmo assim eu passarei.
Inventarei a porta e o caminho
passarei sozinho.