Ela faz cinema

 

                         Bell Gama

bell gama

 

 

 

 

 

 

 

 

Fade in.

A primeira vez em que ela o viu foi pelo view finder. A inglesa e rara Bell-Howell Super8 encontrada em um bazar despertou seu sonho antigo. Sempre quis ser cineasta. Agora, com a câmera nas mãos fazia seu primeiro filme. Ele era o protagonista.

Depois de muito mexer na câmera para tentar fazê-la funcionar, ela desistiu. Definitivamente não era cineasta mas a beleza da peça a contagiou. Não resistiu. Empunhou a câmera, repousou delicadamente seu olho no pequeno orifício e como num susto acabou fazendo uma panorâmica. Apesar de rápido, o movimento foi suficiente para que ela analisasse todas as quinquilharias expostas ali. Muitas pareciam ter sido retiradas de sua memória, da infância que parecia tão distante quanto o seu sonho em fazer um filme.

Ao final do movimento, ele. Tilt. Estava vestido de calça jeans, uma camiseta branca e um tênis despojado. Bastava. Achou bonito de costas. Gostou mais quando ele virou lentamente e mostrou seu rosto. Ela descobriu o zoom.

Ficou surpresa com aquela figura naquele lugar tão abandonado quanto a sua vida nos últimos tempos. Procurou tanto aquele physique du role e agora nem havia precisado fazer casting. Ele simplesmente circulava olhando atentamente cada um dos objetos expostos. Brincava focando e desfocando. Ele, o objeto. O objeto, ele. Ele pegou um ferrorama antigo. Acariciou a caixa.  Certamente também se lembrava de sua infância.

Quando já estava completamente encantada com o jeito que ele olhava para o trenzinho, sentiu sua mão escorregar e bater em um gatilho. A câmera disparou fazendo aquele barulho inconfundível de cinema. Seu coração disparou quick motion. Flash Foward.

Transportou seu pensamento para onde gostaria que fosse o clímax daquele filme. Pensou nele. Em seu apartamento. Lusco fusco. Seus olhares cruzando em slow motion. Sua boca em close up. A boca dele em close up. As duas bocas em close up. Precisava de BG? Desnecessário. O ruído da câmera girando o carretel embalaria o filme mudo dando a dramaticidade necessária para um momento como aquele.

Corte. Voltou em pensamento para o bazar. Perdeu a continuidade. Ele já estava dobrando a esquina. Um halo deixava o andar dele ainda mais bonito, mais poético. Long Shot. Ele, a rua, a tarde, a cidade. Seu filme.

Fade out.

 

“Ela faz cinema” (Chico Buarque), com ele

[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=cGxtihukKiI[/youtube]

 

 

5 comentários

  1. 21/11/13 at 10:05

    Parabéns! Acredito que deve ter saído um bom filme. Gostaria de vê-lo.

  2. Carolgama
    21/11/13 at 12:34

    Nunca é tarde pra gostar da sétima arte.. A arteira da Bell nao ligava pra isso mas agora liga muito! Te amo.. Ficou lindo

  3. André
    21/11/13 at 14:47

    Gama, que ela continue desfrutando da sétima arte eternamente…
    Abraçaço.

  4. paulinho lima
    21/11/13 at 16:51

    A fala de Bell é visual, Tem arte.
    Convivi , por alguns anos com um grupo de cineasta. Dois deles se tornaram amigos. Haroldo Marinho (Baixo Gavea) e Paulinho Sarraceni. Haroldo um craque desrespeitado pela máfia cinematográfica que tomou conta das nossas produções, Atualmente  melhorou. Paulinho nos deixou mas sua arte é ainda respeitada e admirada, um dos “inventores do cinema novo”, onde tudo começou.
    Dell o cinema é das artes a mais complicada, difícil. Uma indústria. 
    Seu caminho está aberto. Sua determinação é seu talento e sua vontade. Bola prá frente, ou melhor câmera pra frente.

  5. paulinho lima
    21/11/13 at 16:57

    Bell volto para consertar, nada de dell ….
    Aproveito e mando uma sugestão. sou audacioso. Que tal um curta baseado numa crônica do paulinho mendes campos. “Coisas abomináveis” e Coisas deleitáveis” ambas no livro Alhos e Bagalhos Qualquer coisa  como o filme do Eduardo Coutinho, Edifício Master, obra prima.
    Perdão pela intromissão e pelo Dell.

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