“E o tempo se rói
Com inveja de mim
Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Pra tentar reviver”
“E o tempo se rói
Com inveja de mim
Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Pra tentar reviver”
Para começo de conversa
com você que me perguntou
qual a fórmula de envelhecer
sem parecer
eu lhe digo: envelheça e apareça.
Não pense que envelhecer
é perecer
quando, apenas e só
envelhecer é acrescentar,
ter na sua porta o luar
e juntá-lo aos muitos luares,
aos mares, plataformas, patamares,
da sua vida que é navegação,
o apito do trem quando chega
e o mugido do boi
que foi, o sino que bate na tarde
e no fogão o fogo que arde.
Some ao cão que lhe abana o rabo
os muitos cães que já teve
e lhe abanaram o rabo quando
você chegou de novo em casa.
E veja que a rosa no jardim
é a rosa desfolhada
que se abre na rosa nova,
enquanto o passarinho voa
com o seu canto
para retornar no passarinho
que tece no galho da árvore
o mesmo ninho.
Não lhe sufoque na garganta
o choro de ontem,
porque também houve o riso
de trasantontem
Some, e não subtraia,
e não caia
para ficar no chão
esparramado.
Lugar de ficar deitado
é na cama
com a mulher que o ama.
Mas a noite não é feita
apenas para dormir.
Também é feita
para repartir,
e todos os bares da madrugada
esperam a sua conversa
com a cerveja na mesa
ou o vinho no copo.
Hoje, amanhã, e depois de amanhã,
e atrás de toda manhã
o sol se levantou,
a chuva caiu, veio o vento,
veio o frio, o calor,
e o pão sobre a toalha de linho
matou a fome do homem
enquanto o galo da alvorada
cantava e canta
para os males que se espantam.
Envelheça, mas não desapareça,
e, um pé aqui, outro ali,
vá por mim
até o fim.